Cooperação | Observatório da China completa uma década

O apoio do Fórum Macau à cultura deve ser intensificado. “Ela é um suporte da economia criativa e de lazer e um pilar para o aprofundamento da identidade de Macau”, salienta Rui D'Ávila Lourido, presidente do Observatório da China, nas vésperas de celebrar dez anos de actividade.

Rui D'Ávila Lourido

 

Texto Patrícia Lemos | Fotos Paulo Cordeiro

Em Portugal

 

O Observatório da China (OC) aproxima-se do seu décimo aniversário, já que foi criado em 2005. Que balanço faz destes anos de trabalho?

A evolução do OC tem sido muito positiva, podemos mesmo dizer surpreendente, quer ao nível da sua capacidade de realização, quer no número de associados. De nove, quando o fundámos em 2005, passámos para mais de uma centena de sócios. E se considerarmos a reduzida dimensão dos estudos chineses em Portugal, este é um número muito significativo. O OC é uma associação de académicos e de pessoas interessadas em estudos multidisciplinares sobre a China e na divulgação da civilização chinesa. A sua principal missão é a organização de actividades académicas ou culturais e o apoio à divulgação de trabalhos de especialistas sobre a China. A sede é em Lisboa, no entanto, tem associados em várias universidades e localidades de norte a sul de Portugal. Possui, igualmente, associados no Brasil, com um activo pólo em Salvador, e na China, em particular nas cidades de Macau, Xangai e Pequim. Esta instituição desenvolve um amplo e diversificado conjunto de actividades, culturais e científicas, em Portugal, na China e no Brasil, de modo a estimular a troca de experiências, a reflexão e a divulgação do conhecimento. Participa também em algumas redes internacionais relacionadas com os estudos chineses, como o East Asia Net e o Fórum China-Europa.

 

Considera que a missão que a China deu a Macau, de ser plataforma para os países lusófonos, está a funcionar?

Consideramos muito importante para Macau e para Portugal, bem como para os países lusófonos em geral, que o Governo Central tenha instituído o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Naturalmente, a China compreendeu a mais-valia que representa a região de Macau, com as suas raízes e ligações histórico-culturais e económicas, para a transformar numa plataforma oficial, facilitadora de contactos com os países lusófonos. Macau tem vindo a consolidar-se como uma plataforma que facilita os negócios para empresários chineses que querem investir em empresas de países de língua portuguesa e vice-versa. Apresenta várias vantagens, designadamente, o sistema legal de Macau que é semelhante ao português, simplificando as relações económicas. Para prevenir uma taxação dupla, foram já criados acordos, entre Macau, Portugal e Moçambique, mas o objectivo é estendê-los a todos os países-membros. Naturalmente que a maior parte dos negócios entre esses países e a China se tem realizado bilateralmente, mas o Fórum tem aumentado as suas oportunidades. A Associação Comercial Internacional para os Mercados Lusófonos tem desenvolvido, igualmente, um diversificado número de negócios. Os investimentos da China nos países lusófonos devem ser enquadrados nas suas relações com África e o resto do mundo.

Rui D'Ávila Lourido

Que recomendações pode fazer nesta área?

Partilhamos da opinião dos que pensam que Portugal e Macau podem e devem reforçar o seu papel, como plataformas facilitadoras de relações culturais e de negócios entre a China e os países lusófonos. As perspectivas futuras das relações económicas entre a China e Portugal são de reforço e valorização, facilitadas com o alargamento do Canal do Panamá, o qual permitirá o acesso mais rápido e directo da China a Portugal. O porto oceânico de águas profundas de Sines sairá valorizado por ser o primeiro na rota para a Europa que os navios gigantes provenientes da Ásia, dos Estados Unidos e do Brasil encontrarão no Velho Continente. O reforço das relações económicas de Portugal com a China é muito positivo, e deveremos intensificar e aprofundar as relações culturais e académicas, pois a sua importância estratégica é fundamental para o convívio salutar entre os povos.

 

E a nível cultural?

Além da actividade estritamente económica, as autoridades passaram também a atribuir ao Fórum Macau um papel de apoio à cultura, na medida em que ela é um suporte da economia criativa e de lazer e um pilar para o aprofundamento da identidade de Macau. Achamos que é necessário aprofundar e intensificar esse caminho. O governo da RAEM tem tido uma extraordinária sensibilidade na preservação do património histórico de matriz portuguesa. Em Macau tem sido estimulado o intercâmbio com as culturas e a língua portuguesa, nomeadamente, apoiando a educação de formadores para o ensino da língua portuguesa na China, a organização de encontros, colóquios e conferências internacionais e incentivando a difusão da obra de escritores sobre Macau. O Observatório da China gostaria de contribuir para uma maior divulgação da cultura macaense e chinesa em Portugal e no Brasil.

Rui D'Ávila Lourido

Como vê as relações entre a China e a Lusofonia nos próximos anos?

A tendência é claramente de crescimento das relações da lusofonia com a China, que estabeleceu relações nos cinco continentes com os países de língua portuguesa produtores de matérias-primas, de hidrocarbonatos (petróleo de Angola, Brasil e Timor, gás natural de Moçambique), ou alimentares (do Brasil a soja) e tecnologias alternativas (como as eólicas, em Portugal). Os indicadores apontam para que esse relacionamento se intensifique com base no interesse mútuo. A China tem-se revelado um parceiro estrategicamente importante para a recuperação económica europeia e ocidental. Paralelamente à necessidade de intensificar a divulgação do conhecimento sobre a civilização chinesa e à miscigenação entre a comunidade chinesa e as populações lusófonas respectivas, será necessário dar uma atenção cuidada à intensificação do relacionamento entre as respectivas comunidades, a fim de aprofundar as interacções sociais e culturais.

 

Qual o relacionamento do OC com as autoridades chinesas e a comunidade chinesa em Portugal?

O progressivo envolvimento do OC com entidades na China decorre da ampliação da nossa actividade e do desenvolvimento da nossa missão principal: contribuir para o aprofundamento do conhecimento e da divulgação da civilização chinesa em Portugal e no espaço da lusofonia. Com o aumento das nossas responsabilidades, estabelecemos com as autoridades chinesas um bom relacionamento de cooperação para a promoção de actividades culturais de interesse mútuo. Destacamos o apoio activo da Embaixada da China e do Ministério da Educação da China ao programa “Portugal China: Encontro de Culturas, 2013-2014”, que incluiu várias celebrações, nomeadamente os 20 anos da Lei Básica de Macau e os dez anos da criação do Fórum Macau. Este ano também assinalamos os 35 anos de reatamento das relações diplomáticas e oficiais de Portugal com a China. Com a comunidade chinesa em Portugal temos colaborado e estreitado as relações ao longo dos anos. O Observatório abriu-se, sob a minha presidência, à filiação de chineses. Alguns têm actualmente responsabilidades nos órgãos de gestão do OC, como por exemplo, Y Ping Chow, presidente da Liga dos Chineses em Portugal.

Rui D'Ávila Lourido

Que projectos têm em curso para apoiar a comunidade chinesa de Portugal?

A nível cultural, destaco o espectáculo de Ópera de Pequim que levámos aos palcos de cinco cidades portuguesas. Em termos sociais, temos um projecto, que aguarda financiamento, para disponibilizar aos serviços públicos de saúde da Região de Lisboa e Vale do Tejo um software que facilite a comunicação de chinês para português e vice-versa, numa consulta padrão de clínica geral. Apoiamos também algumas iniciativas de associações portuguesas que promovem o intercâmbio comercial e cultural Portugal-China, realçando que somos membros fundadores da Câmara de Cooperação e Desenvolvimento Portugal-China. Pela nossa intensa actividade cultural na divulgação da civilização chinesa, fomos homenageados e galardoados com o “Prémio de Mérito Cultural 2012”, na festa chinesa de passagem do Ano Chinês da Serpente em 2013, pela comunidade chinesa através do Conselho de Mérito da Liga de Chineses em Portugal.

 

De que forma se traduz a maior curiosidade de Portugal na China, por exemplo, ao nível do ensino?

A curiosidade pela cultura chinesa tem aumentado em Portugal, acompanhando o crescente interesse de entidades portuguesas em desenvolver iniciativas culturais ou económicas relacionadas com a China. Várias instituições universitárias portuguesas passaram a dar grande atenção à China e estabeleceram relações com universidades estrangeiras. Em Portugal estudam cerca de 500 alunos chineses. Há institutos Confúcio (Lisboa e Minho), com os cursos de chinês sempre lotados, licenciaturas, mestrados e outros cursos especializados em várias universidades.

 

Qual o contributo dos grupos de trabalho do OC para o aprofundamento do conhecimento sobre a China? Pode destacar um desses núcleos?

A razão de ser destes grupos deve-se à importância estratégica dos temas a que se dedicam e ao facto de termos associados especialistas e interessados nesses tópicos. Criámos mais um grupo de trabalho dedicado ao audiovisual, de que fazem parte os nossos associados realizadores de cinema e jornalistas da área. Este grupo está de momento a dinamizar a preparação do Festival Internacional de Cinema Chinês e Lusófono. Os nossos grupos de trabalho têm contribuído para dinamizar várias áreas do conhecimento e da cultura através da organização de eventos descentralizados, de modo a estimular o debate e a troca de conhecimentos, de opiniões e de experiências através de tertúlias, palestras para apresentação de investigações em curso e outras já concluídas. Na área da lusofonia analisaram-se, nomeadamente, o papel da língua portuguesa e do mundo lusófono em Macau, na China e nos países lusófonos. No âmbito da Economia e no das Relações Internacionais foi organizada em Dezembro de 2013, a Conferência Internacional “Os Primeiros Dez Anos do Fórum Macau: Desafios e Oportunidades para a Lusofonia”, no auditório da Delegação Económica e Comercial de Macau, em Lisboa. No âmbito histórico-cultural estudou-se a influência chinesa nas mentalidades e sociedades europeias através do comércio de produtos preciosos; a visão da China através do cinema português; vivências de Macau, entre outros. A reflexão e acção dos grupos de trabalho permitem-nos fundamentar e desenvolver várias iniciativas a nível internacional. O OC considera importante contribuir para a divulgação do conhecimento sobre a China nos países de língua portuguesa, pelo que estabeleceu também alguns protocolos com instituições lusófonas.

 

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Grupos de Trabalho do OC

. Ambiente e Recursos Energéticos

. Audiovisual

. Ciência e Tecnologia

. Cultura e Sociedade

. Economia e Gestão Empresarial

. História

. Política e Relações Internacionais

 

 

Actividades em destaque

São várias as actividades que o Observatório da China realiza todos os anos e muitas em parceira com outras entidades. Em Portugal, Brasil, Macau e China, esta entidade tem participado na organização de conferências, eventos culturais que assinalam datas importantes na história das relações com a China e com Macau. É ainda interessante notar as acções que promove e ou a que se alia em prol da comunidade chinesa em Portugal.

  • “Macau-China em Lisboa” – assinalou os 30 anos de reatamento dos Laços Diplomáticos entre China e Portugal e os dez anos da criação da RAEM (conferências, espectáculos e exposições sobre Macau e a China), em Lisboa, 2009.
  • XI Congresso Luso Afro-Brasileiro coordenou temas e promoveu a participação de Mia Couto, no Brasil, 2011.
  • Programa Portugal-China: Encontro de Culturas, 2013-2014:

Promoção da conferência internacional Face to Face: the transcendence of the Arts in China and beyond (Lisboa).

Concerto “Amizade Lusófona com a China”, com artistas portugueses, brasileiros, angolanos e chineses (Pequim).

Ópera de Pequim – Mitos e Lendas da China (cinco cidades portuguesas).

 

  • Apoio ao Encontro de Escritores de Língua Portuguesa – Brasil, 2013 e 2014.
  • Organização do Festival Internacional de Cinema Chinês e Lusófono – Lisboa, 2014.

 

 

Aumento gradual dos chineses residentes em Portugal

Em 2001 eram 3953 e sete anos depois ultrapassam os 13.300. No último relatório do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, publicado em Dezembro de 2012, a comunidade chinesa ocupava o sétimo lugar na imigração, com 4,2% do total da população estrangeira em Portugal, possuindo 17.447 autorizações de residência no país.