Dossiê MTC | Duas medicinas, um caminho

O sistema de saúde deve caminhar no sentido de uma maior integração dos dois tipos de medicina – tradicional e convencional. A ideia é defendida por Liu Liang, director da Faculdade de Medicina Tradicional Chinesa da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (MUST, na sigla inglesa)

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Texto Sofia Jesus

 

 

A MTC, reconhece o também reitor da universidade, é cada vez mais “respeitada” entre médicos e cientistas do Ocidente, mas ainda existe muito debate. “Na minha opinião, é preciso ultrapassar isto e unir esforços”, defende, em entrevista à MACAU.

O investigador começou por estudar medicina ocidental e só depois enveredou pelo ramo da MTC. “Descobri que cada uma tem as suas próprias características e as suas próprias vantagens”, explica o académico, que tem impulsionado estudos sobre as possibilidades de integração das duas medicinas.

No caso da MTC, diz, há uma “abordagem holística” – que olha para tudo no corpo como uma rede de interligações – e, ao mesmo tempo, personalizada. Tendências que, sublinha, a própria medicina convencional tem vindo recentemente a procurar seguir, ainda que à sua maneira.

Por outro lado, explica o académico – que tem também exercido funções como consultor da Organização Mundial de Saúde –, a medicina convencional consegue identificar “muito claramente” interacções ao nível molecular ou alvos da acção de determinadas drogas, por exemplo. Liu Liang defende, por isso, a necessidade de modernizar a MTC, apostando na investigação científica para identificar os mecanismos terapêuticos do corpo.

“Se, baseados nos métodos tradicionais, pudermos usar critérios tradicionais para avaliar a situação de um ponto de vista holístico, mas, por outro lado, apresentarmos também dados científicos de uma forma mais clara, então estaremos a fazer a MTC andar para a frente na sociedade moderna”, comenta o também membro do Conselho para os Assuntos Médicos da RAEM.

Liu Liang conta que um dia lhe perguntaram o que iria ser da MTC depois de a medicina convencional ter anunciado o mapeamento do genoma humano. O académico não se mostrou preocupado. Os genes, brincou, são como os edifícios em Hong Kong – “o mais difícil [de compreender] é a coordenação entre eles, as interacções”.

 

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Aos olhos da Organização Mundial de Saúde

A MTC está, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), integrada por completo no sistema nacional de saúde da China e tem vindo a receber o apoio do Governo de Pequim, que desenhou uma nova estratégia nacional para contribuir para o seu desenvolvimento – a ideia passa não só por reforçar a aplicação de leis e regulamentos, mas também por investir na modernização deste tipo de medicina, através da ênfase à investigação científica e da estandardização de práticas tradicionais.

Há, no entanto, alguns desafios a ultrapassar, escreve a OMS na sua página oficial na Internet. Além da necessidade de “reforçar a capacidade de fazer cumprir a lei”, a organização defende que é também preciso olhar para o sistema de registo e para a regulamentação em vigor de modo a avaliar “a segurança e a eficácia” do sector e a assegurar a sua “qualidade”.

A OMS sublinha ainda que as orientações para a condução de testes clínicos precisam de ser desenvolvidas, de modo a “demonstrar a eficácia dos produtos tradicionais”. Por isso, o organismo argumenta que é necessária mais investigação e mais testes baseados em provas.

A Estratégia OMS Medicina Tradicional 2014-2023 é um documento orientador que visa apoiar os Estados membros no desenvolvimento de “políticas proactivas” e da implementação de planos de acção que “reforcem o papel que a Medicina Tradicional tem na manutenção da saúde das populações”.

O plano estratégico assenta em quatro ideias-chave: “integrar a Medicina Tradicional nos sistemas de saúde, onde tal seja exequível”; promover a sua “segurança, eficácia e qualidade”; alargar o recurso a este tipo de medicina, tornando-a, por exemplo, mais economicamente acessível, e, por fim, promover o “uso racional” desta medicina entre profissionais e consumidores.

De acordo com as estatísticas, existem na China 440.700 instituições que disponibilizam serviços de Medicina Tradicional – num total de 520.600 camas – , incluindo unidades hospitalares especializadas neste tipo de medicina. Por outro lado, 90 por cento dos hospitais generalistas incluem um departamento – e serviços – de Medicina Tradicional, para pacientes internos e externos.

Actualmente, existem sete Centros de Colaboração da OMS para a Medicina Tradicional.