Suspensa intervenção em antigos estaleiros de Macau para avaliar valor patrimonial

O Instituto Cultural de Macau anunciou que vai iniciar em Abril o procedimento para decidir se os antigos estaleiros navais na ilha de Coloane serão classificados.

“Vamos suspender a emissão de licença de construção. Nenhuma obra pode ser realizada. Já não podem ser demolidos estaleiros. Será muito tarde só fazermos a abertura da classificação agora, com dois estaleiros demolidos? Tivemos de considerar a segurança pública”, disse o presidente do IC, Leung Hio Ming.

O processo de classificação “não vai ser mais de um ano”, disse o responsável, acrescentando que durante aquele período não podem ser realizadas construções nos nove lotes, nem efectuadas mais demolições.

No início do mês, dois lotes dos estaleiros da localidade de Lai Chi Vun foram demolidos por razões de segurança, o que levou à apresentação de três petições (a última com 670 assinaturas) a exigir a classificação do conjunto de estruturas na vila piscatória de Coloane.

A classificação envolve diferentes departamentos governamentais e uma consulta pública para avaliar se os estaleiros passam a estar protegidos ao abrigo da Lei de Património Cultural.

Leung salientou que o valor dos antigos estaleiros, que fizeram sair o seu último barco há mais de uma década, tem que ver com as “artes navais”, com o modo de vida da população da zona, e “a relação harmoniosa entre montanhas e água”.

O IC acredita ser possível ter no local “instalações muito boas”, para “mostrar a história da construção naval como organismo cultural”, disse.

“Queremos construir um museu sobre as artes da construção naval, é numa zona ao pé da montanha e da água, as pessoas podem aproveitar o ambiente”, sublinhou Leung, garantindo que o IC vai defender esta perspectiva durante o processo de avaliação.

Presente na conferência de imprensa esteve David Marques, da associação de moradores de Lai Chi Vun, que considerou a suspensão de qualquer intervenção uma “boa notícia”.

“Depois de a questão da segurança ter sido afastada, a preservação [deve] manter a personalidade e a alma da vila”, disse aos jornalistas, à margem da conferência.

Marques, de 30 anos, explicou que os moradores receavam que, depois de os estaleiros serem demolidos, a vila pudesse seguir-se, já que iria “perder-se a parte integrante da paisagem, [a forma] como as pessoas costumavam viver”. “Todos têm memórias” do tempo áureo da construção naval, nos anos 1990, salientou.

“Mas agora os estaleiros vão ficar por pelo menos mais um ano, [em que se pode] reforçar o local, dar-lhe mais carácter, mais alma. Os moradores podem dormir descansados”, afirmou. Entre dez a 15 famílias vivem actualmente na vila de Lai Chi Vun, acrescentou.

David Marques disse apoiar o desenvolvimento de actividades culturais na zona, mas alertou para a importância de manter a pacatez do local, receando a atracção de turistas em grandes números. “Gostaria de ver um ambiente mais vibrante, mais coisas a acontecer lá, mais artes, mais cultura. Pessoalmente gostava de ver o grau de literacia da população subir, coisas que os façam felizes, mas ao mesmo tempo que não se gere demasiada pressão, muitas pessoas a chegar. Aumento da qualidade de vida, essencialmente, mas mantendo a alma, mantendo o modo de vida”, explicou.

Marques salientou, em particular, a questão das actividades noturnas. “Uma coisa que é muito importante para a vila é que à noite é muito calma. Os moradores gostam de ir dormir cedo e acordar cedo, passear cedo na vila”, concluiu.