Uma porta aberta

Numa imagem proposta pelo secretário para a Economia e Finanças da RAEM, Francis Tam, no âmbito da cooperação, cabe ao Governo fazer o trabalho de promoção, de “abrir a porta”, enquanto dos empresários se espera que aproveitem a oportunidade dada e façam negócios

Há três anos nascia um projecto que reunia à volta da mesma plataforma nações que vinham mantendo, desde há vários anos, uma cooperação regular a vários níveis. O Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa surgiu como um dado novo nas relações internacionais, abrindo a porta a uma infindável combinação de possibilidades.
Desde Outubro de 2003 que os sinais de aprofundamento da cooperação são claros, quer ao nível do comércio, quer do investimento, já para não falar do aumento das visitas de nível ministerial.
Em três anos o comércio bilateral aumentou mais de 100 por cento – passou de cerca de 11 mil milhões de dólares norte-americanos, em 2003, para mais de 23 mil milhões, em 2005, ao mesmo tempo que os grandes projectos de cooperação emergiram.

A agenda criada através do Fórum

Três anos depois da criação do Fórum e mais de dois anos após o estabelecimento, em Macau, do Secretariado Permanente do Fórum, o balanço que todas as partes fazem desta experiência é positivo, embora haja igualmente o reconhecimento de que há potencialidades para fazer mais e melhor. O secretário-geral do Secretariado Permanente, Wang Chengan, salienta que tem tido “todo o apoio de todas as partes envolvidas: Governo de Macau, Governo Central e autoridades dos países de língua portuguesa”.
O primeiro triénio desta experiência serviu para balizar a esfera de competências de cada uma das partes, para cimentar um quadro político institucional e criar consensos em termos de agenda de cooperação.
Partindo quase do zero, a estrutura do Secretariado Permanente procurou abrir a porta para as oportunidades que surgem nesta zona do mundo para os países lusófonos e mostar aos agentes económicos chineses as potencialidades que existem no vasto mundo dos países de língua portuguesa.
No entendimento de Júlio Morais, embaixador de Cabo Verde na China, “estes três anos serviram para criar consensos em termos de agendas e dinâmica negocial”. Por seu turno, na entrevista que publicamos com este artigo, o secretário para a economia e finanças da RAEM, Francis Tam, não tem dúvidas de que “os resultados do Fórum evidenciaram que Macau é de facto um elo de ligação entre a China continental e os países de língua portuguesa”, garantindo que “o papel da RAEM foi reforçado”.
Do lado do sector privado, Eduardo Ambrósio, presidente da Associação Comercial Internacional dos Mercados Lusófonos, sublinha que, desde 2003, os “dirigentes de Macau vêm prestando constante apoio às ligações comerciais e económicas entre a RAEM e os países lusófonos”, ao mesmo tempo que reconhece que “este é um processo de médio e longo prazo”, pelo que “mais e melhores oportunidades surgirão no futuro”.

Aproximação entre Macau e os países lusófonos

Desde 2003, o Secretariado Permanente tem organizado várias iniciativas no sentido de materializar a cooperação e estimular os negócios, em Macau, na China e nos países de língua portuguesa, nomeadamente feiras comerciais, conferências, missões empresariais e contactos de alto nível entre representantes dos países e territórios do Fórum.
Em termos de investimentos de empresários de Macau nos países lusófonos, há dois projectos que se destacam: por um lado a aposta de David Chow em Cabo Verde, de construção de um complexo turístico no ilhéu de Santa Maria, num investimento de 100 milhões de dólares norte-americanos; por outro a assinatura, em Dezembro de 2005, de um acordo entre a Geocapital, um consórcio financeiro com base em Macau detido maioritariamente por Stanley Ho, a Mozza Capital, sociedade financeira moçambicana, e a Sogir – Sociedade de Gestão Integrada de Recursos, que está ligada ao Gabinete do Plano de Desenvolvimento do Vale do Zambeze, com vista à prospecção, detecção e recenseamento das oportunidades de aproveitamento económico dos recursos naturais da zona de inserção geográfica do rio Zambeze – uma das zonas mais ricas em termos de recursos naturais da África Austral.

Macau: a plataforma

A escolha de Macau como sede do Secretariado Permanente do Fórum pode ser explicada em virtude de vários factores. Primeiramente, o português é uma das línguas oficiais de Macau, na sequência do que está estipulado na Lei Básica da RAEM, o que por si só poderá funcionar como ponte para a entrada de companhias dos países de língua portuguesa no mercado chinês, em especial para a zona do Sul da China, no Grande Delta do Rio das Pérolas – zona económica que reúne nove províncias meridionais e as duas regiões administrativas especiais, Macau e Hong Kong. Em segundo lugar, dado que o sistema jurídico de Macau é de raiz portuguesa, existem condições que podem facilitar a utilização da RAEM como plataforma para as relações económicas sino-lusófonas. Em concreto, as empresas dos países lusófonos podem encontrar vários peritos legais, juristas e outros agentes que poderão efectuar um trabalho ao nível da consultoria e marketing assente num bom conhecimento quer do mercado do Continente, quer do mercado dos países de língua portuguesa.
Jorge Morbey, ex-adido cultural na Embaixada de Portugal na China, recorda que “historicamente Macau sempre funcionou como uma plataforma de negócios entre as regiões da Ásia Oriental, do Sudeste Asiático, África, Europa e o continente americano”. Além das relações de mais de quatrocentos anos com Portugal, Macau tem tido, ao longo dos anos, com as antigas colónias portuguesas de África, relações comerciais significativas ao nível do vestuário, louças e mobiliário, para citar alguns exemplos. Deste modo, a criação em Macau deste fórum de cooperação surge como um passo lógico numa dinâmica histórica. Numa outra perspectiva, ele poderá também servir para criar alternativas e outros caminhos para uma economia cada vez mais dependente do Jogo. É nesse sentido que Jorge Morbey refere que “o Fórum tem importância essencial para a RAEM, na medida em que possa contribuir para a criação de riqueza e constituir-se numa das alternativas à indústria do jogo”.
Este processo transporta consigo também um significado político relevante. A ideia de Macau como plataforma de serviços tem sido materializada com a inclusão do território em projectos como o processo “9+2”, o CEPA- Acordo de Estreitamento das Relações Económicas e Comerciais entre o Continente Chinês e Macau, e o Fórum. Neste contexto, Macau assume um papel político-económico relevante no contexto regional e internacional.

O Fórum como parte de uma estratégia ampla

O Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa deve ser entendido num contexto amplo da estratégia da China não só na sua relação com os países lusófonos mas também relativamente às nações em desenvolvimento e à postura que o País tem assumido nas relações internacionais. Olhando para o percurso do País no sistema internacional desde a ascensão ao poder, no final dos anos setenta, de Deng Xiaoping, o Governo Central procura desenvolver uma estratégia com várias facetas e em várias direcções baseada nos princípios da “política externa independente” e nos conceitos de “paz e desenvolvimento” enunciados por Deng.
É neste contexto que alguns analistas têm encarado o fortalecimento das relações da China com os países de língua portuguesa, nomeadamente com a África lusófona.
Ian Storey e Loro Horta referem, num artigo publicado em Junho pela revista Yale Global, ligada á Universidade norte-americana de Yale, que “a diplomacia chinesa está cada vez mais sofisticada: “Ao contrário de outros poderes, que mantêm relações próximas com países específicos da CPLP mas têm pouca ou nenhuma interacção com outros membros, a China não limita o seu relacionamento aos países de língua numa base bilateral, mas como um grupo”.
Segundo o académico australiano e o investigador timorense, os objectivos da China com esta relação mais próxima com as nações lusófonas passam pela necessidade de garantir alternativas de petróleo essencial para o seu rápido crescimento económico. Por outro lado, escrevem Storey e Horta, os 230 milhões de habitantes dos países de língua portuguesa constituem um mercado importante para escoar os bens produzidos na China.
Tendo em conta que a China tem relações bilaterais com quase todos os países de língua portuguesa, será que o Fórum representa algo de redundante? Muito pelo contrário. Morbey observa que “o canal de comunicação bilateral é reforçado pela sua pertença ao Fórum, sem que tal constitua uma triplicação redundante”. Mais: “o Fórum cria um ambiente para uma cadeia infinita de oportunidades”.

Os passos em frente

“A segunda reunião ministerial vai ser um sucesso”, garante Wang Chengan, referindo-se ao encontro marcado para os dias 25 e 26 de Setembro, na Região Administrativa Especial de Macau. Essa confiança é corroborada por Francis Tam – o secretário para a economia e finanças adianta que “algo está a ser preparado”. Algo que poderá ser um novo marco nas relações sino-lusófonas.
Júlio Morais, por seu turno, diz que o Segundo Plano de Acção para a Cooperação Económica e Comercial, que será assinado na reunião ministerial, “vai ser mais forte” e “irá expandir o reforço da cooperação ao sector financeiro, transportes e turismo”. Ou seja, é de esperar que estas e outras vertentes sejam acrescentadas ao primeiro Plano de Acção, que foi assinado em Outubro de 2003 pelos responsáveis governamentais da China e dos países de língua portuguesa. Nesse documento salientava-se a necessidade de trabalhar ao nível da cooperação inter-governamental e ao nível do comércio e investimento, desenvolvendo as ligações ao nível da agricultura, pescas, engenharia, construção de infra-estruturas, recursos naturais e recursos humanos. Em todo o caso, o embaixador cabo-verdiano alerta que “o sector privado vai ser cada vez mais importante”.
Finalmente Jorge Morbey vê como desejável a possibilidade da criação de “agências especializadas para a coordenação de programas conjuntos que incidissem sobre aspectos como os recursos marinhos, medicinas alternativas, recursos energéticos e estratégias de mercado para as exportações”.

“China está mais próxima dos países de língua portuguesa”

Na análise dos resultados do Fórum, defende Francis Tam, há que ter em conta não só a componente dos negócios mas também a política. A relação mais próxima entre a China e os países de língua portuguesa é um facto constatado na imprensa internacional e Macau deu o seu contributo para essa realidade

– O Fórum para Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa foi lançado há três anos. Que avaliação faz da sua implementação?

– Os resultados do Fórum evidenciaram que Macau é de facto um elo de ligação entre a China continental e os países de língua portuguesa. O papel da RAEM foi reforçado.
No que diz respeito à cooperação, os negócios são um lado da moeda, o outro diz respeito às conquistas políticas. Tenho lido artigos em artigos de jornais internacionais. E cada vez mais as pessoas que estão atentas a este fenómeno notam que a China está mais próxima dos países de língua portuguesa. E isto é algo para o qual o Fórum contribuiu.

– O Fórum veio tornar o papel de Macau mais visível e relevante no próprio contexto da República Popular da China…

– É verdade. Esse papel é mais visível do que era antes. Mas mais do que ser visível são os resultados que estão à vista de todos. Sempre dissemos que somos uma plataforma. Mas os resultados estão à vista de toda a gente: A China tem uma relação mais próxima com os países de língua portuguesa. Se compararmos a situação agora com o que aconteceu há três anos, ninguém pode negar esta evidência. E o Fórum desempenhou um papel importante. Os resultados são melhores e mais importantes que as palavras.

– Macau está envolvido no processo de cooperação entre as nove províncias do sul da China e as duas regiões administrativas especiais, o chamado processo “9+2”. Qual é a relação entre o processo do Grande Delta do Rio das Pérolas e o Fórum?

– Macau, sendo parte do “9+2”, está integrado num processo que nos permite ter um contexto. Nesse contexto, os países de língua portuguesa podem interagir com o Sul da China através de nós, uma vez temos um sistema de comunicação imediata.
Claro que sempre se pode pedir ajuda ao Departamento de Comércio, em Pequim, mas tendo esta ligação directa com as nove províncias do Sul da China, vamos demonstrar que este sistema funciona.

– O mesmo vale para o CEPA, o Acordo de Estreitamento das Relações Económicas e Comerciais entre o Continente Chinês e Macau?

– Sim, exactamente, é mais um quadro de actividade, um contexto para imprimirmos esta dinâmica.

– Numa visita a Yunnan, aquando do último encontro do “9+2”, o Chefe do Executivo mencionou que Macau poderia também funcionar como uma ponte entre os países de língua portuguesa e a ASEAN, as nações do sudeste asiático. Isto é algo de novo.

– Yunnan é um local especial na ligação com outros países do Sudeste Asiático. Quando o Governo de Macau lá esteve [em Setembro passado, no âmbito do Fórum do Grande Delta do Rio das Pérolas], estavam presentes também representantes de países da ASEAN [Associação dos Países do Sudeste Asiático].
Como é que deve funcionar uma plataforma? Deve ter várias ligações. Pelo menos em duas direcções, para alguém possa usar a plataforma e escolher para onde ir. Em futuros desenvolvimentos, temos de encontrar mais saídas, para que quem use a plataforma possa ter mais ligações com o exterior. Isto é algo que temos de fazer. Nós vamos ligar todos estes contextos: ASEAN, CEPA, “9+2” e países lusófonos.
É assim que Macau pode reforçar o seu papel de plataforma de serviços.

– Este ano a Feira Internacional de Macau (MIF) vai decorrer em simultâneo com o Fórum. A ideia é criar oportunidades para empresários chineses e de língua portuguesa se encontrarem?

– Sim. Todos os anos organizamos visitas de delegações de outros países para estarem em Macau. Esperamos que a MIF seja um sucesso. Virão grandes delegações da China continental para Macau.

– E com o encontro de empresários da China e dos países lusófonos a realizar-se ao mesmo tempo essas oportunidades estarão aumentadas.

– Sem dúvida. Esperamos que em todos os aspectos, o Fórum seja um sucesso.

– Nesta segunda reunião do Fórum, podemos esperar um passo firme em frente na cooperação entre a China e os países de língua portuguesa? De que modo?

– Estamos a trabalhar nesse sentido. O ministro do Comércio, Bo Xilai, tem uma personalidade forte e é um líder para o futuro. Por isso ele não vai estar em silêncio e está a trabalhar em algo para o sucesso do Fórum. Ele virá a Macau fazer o seu discurso e depois regressará a Pequim.

– No que diz respeito à relação de Macau com os países de língua portuguesa, foi anunciado recentemente que o Governo da RAEM tem um acordo quase pronto com Moçambique de modo a evitar a dupla tributação. Vamos assistir a este tipo de acordos com os restantes países de língua portuguesa?

– Sim, definitivamente. Estamos a falar com todos os países de língua portuguesa e a resposta é muito boa. Ainda este ano vamos assinar com Moçambique. Há ainda a possibilidade de haver mais um ou dois países a assinar antes do fim do ano. É um trabalho que estamos a desenvolver.

– No que diz respeito ao aumento do comércio e do investimento, que papel pode o Governo de Macau ter para aumentar as relações sino-lusófonas?

– Eu penso que do lado do Governo temos sempre de fazer o trabalho de promoção. Levamos delegações a Angola, Moçambique e outros países de língua portuguesa. Estamos a envolver empresários de províncias do Sul da China, como Guangdong e Fujian, para que haja mais oportunidades de negócios.

– Portanto, Macau abre a porta…

– Sim, como disse, temos de abrir a porta. Depois cabe aos empresários fazer os negócios.

Grande atenção aos recursos humanos

Para Wang Chengan, desde o seu lançamento que o Fórum tem dedicado uma atenção especial ao desenvolvimento dos recursos humanos. Exemplo disso é o facto de Ministério do Comércio ter convidado mais de 600 responsáveis governamentais e técnicos dos países de língua portuguesa para frequentarem acções de formação na China

– Qual a avaliação que faz destes quase três anos de existência do Fórum?

– A realização da 1.ª Conferência Ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Macau) em 2003, numa iniciativa do Governo Central Popular da República Popular da China, foi um sucesso, tendo ali sido assinado um “Plano de Acção para a Cooperação Económica e Comercial”. Com o empenho do Ministério do Comércio da China, do Governo da Região Administrativa Especial de Macau e dos Governos dos Países de Língua Portuguesa, os objectivos definidos pelo Plano de Acção foram progressivamente concretizados no triénio 2004-2006.
O Fórum tem vindo a produzir resultados positivos, nomeadamente na vertente do reforço da cooperação no desenvolvimento dos recursos humanos, tendo o Ministério do Comércio da China convidado mais de 600 autoridades e técnicos dos países de língua portuguesa, para frequentarem colóquios na área económica, na área do turismo e da comunicação social, cursos de formação de técnicas de enfermagem, cursos de formação técnica em agricultura e pescas e um colóquio sobre gestão moderna de transportes. Por sua vez, o Governo da Região Administrativa Especial de Macau convidou os participantes de alguns dos colóquios atrás referidos, para efectuarem visitas de estudo e frequentar cursos em Macau, tendo aqui sido feitas algumas apresentações sobre oportunidades de negócios e investimento da China e dos países de língua portuguesa.
Também no que diz respeito às trocas comerciais há a registar resultados positivos. O valor global das trocas comerciais entre a China e os países de língua portuguesa atingiu, em 2004, os 18270 milhões de dólares norte-americanos, registando-se um aumento de 65,7 por cento comparativamente a 2003, ano em que foi criado o Fórum. Em 2005, o valor global das trocas comerciais entre as partes atingiu os 23.190 milhões de dólares norte-americanos, com um aumento de 26,9 por cento, em comparação com 2004, tendo ultrapassado pela primeira vez a barreira dos 20 mil milhões de dólares norte-americanos.

– Antes da criação deste Fórum, já existiam relações bilaterais entre a China e cada um dos países de língua portuguesa. Em que medida é que essas relações foram aprofundadas através de Macau?

– O papel de plataforma de Macau no reforço da cooperação económica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa resulta naturalmente de três características de que o território dispõe, nomeadamente a manutenção da língua portuguesa como uma das línguas oficiais, a permanência de uma comunidade dos países de língua portuguesa significativa (e que tem contribuído para a ligação com os países participantes do Fórum) e a manutenção do sistema jurídico de matriz portuguesa, que tem contribuído para atrair a vinda para Macau de técnicos qualificados.
Por outro lado, o ensino da língua portuguesa é amplamente apoiado pelas autoridades de Macau, verificando-se um aumento gradual de formandos interessados na aprendizagem da língua.
A existência de pessoal qualificado de língua portuguesa (e em alguns casos, bilingues) em diversas áreas tem contribuído para o reforço da cooperação económica e comercial entre os empresários da China e dos países de língua portuguesa.
Há ainda a considerar a localização do território no delta do Rio das Pérolas – e as suas ligações económicas e comerciais crescentes com as províncias chinesas vizinhas – bem como o papel de Macau no relacionamento com os chineses ultramarinos e as suas históricas relações com os países de língua portuguesa.
Deste modo, Macau pode desempenhar um papel de ponte de ligação no desenvolvimento das relações económicas e comerciais entre a China e os países de língua portuguesa, em vários sectores no âmbito da prestação de serviços económicos e comerciais. Houve ainda empresas de Macau que iniciaram contactos e avaliaram informações sobre oportunidades de negócios e investimento nos países de língua portuguesa.

– Está satisfeito com a reacção e a dinâmica dos agentes económicos dos países lusófonos ao longo destes três anos?

– Sim, estamos muito satisfeitos com os esforços desenvolvidos até ao momento; foram já realizados encontros empresariais entre a China e os países de língua portuguesa, em Luanda em 2005 e em Lisboa em 2006 (sem esquecer o encontro que decorreu em Macau, no âmbito da 1ª Conferência Ministerial em 2003). Nestes encontros, que contaram com a participação de centenas de empresários da China e dos países de língua portuguesa, foram assinados vários protocolos e contratos comerciais.
Por outro lado, também se realizaram encontros empresariais em Timor Leste e Cabo Verde em 2005 e em Moçambique em 2006. Recentemente, esteve em Moçambique um grupo de empresários chineses para avaliação no local de algumas oportunidades de negócios naquele país.
Saliento ainda o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pelas associações empresariais de Macau, nomeadamente as de matriz lusófona, na aproximação que têm feito aos países de língua portuguesa, aproveitando assim as sementes lançadas pelo Fórum.

– O que é que tem sido feito e o que está projectado fazer-se no que diz respeito à formação de pessoas qualificadas que ajudem à concretização das políticas traçadas?

– Desde o início do Fórum que se tem dado uma grande atenção ao desenvolvimento dos recursos humanos.
O Ministério do Comércio da República Popular da China já levou a cabo um conjunto de acções de formação em vários sectores de actividade, já apontados anteriormente. O aumento do intercâmbio na formação de pessoal qualificado vai certamente, de futuro, estimular e alargar as áreas para o desenvolvimento dos recursos humanos. De salientar que o Governo da RAEM, através de diversos serviços públicos, tem dado o seu contributo na área da formação no âmbito do Fórum.

– Um dos pontos do Plano de Acção do Fórum diz respeito à cooperação na agricultura e pescas. O que foi feito até agora neste campo?

– Em 2005 foram realizados dois cursos de formação na área da agricultura e pescas. Em primeiro lugar, realizou-se em Cantão um curso de formação técnica em agricultura e pescas e, no seu seguimento, algumas empresas da China e do Brasil estabeleceram contactos de cooperação nesta área.
O segundo realizou-se em Pequim, onde teve lugar um colóquio sobre o desenvolvimento sustentável da agricultura e pescas. Na sequência deste colóquio, os seus participantes apresentaram um conjunto de propostas para incrementar a cooperação nesta área entre a China e os países de língua portuguesa.
É de referir ainda que, no âmbito do Fórum, uma empresa da China está a negociar com uma empresa de Timor Leste a implementação de um projecto de produção de arroz híbrido.

– Quais são os passos necessários para que o Fórum tenha mais resultados práticos?

– A realização da 2ª Conferência Ministerial, nos dias 24 e 25 de Setembro próximo em Macau, e a aprovação de um segundo Plano de Acção para a Cooperação Económica e Comercial, para vigorar no triénio 2007-2009, vai certamente contribuir para o fortalecimento do Fórum e para o incremento das relações económicas e comerciais entre os países participantes e o alargamento a novas áreas de cooperação.

A senhora “Fórum”

Rita Botelho dos Santos é uma das caras mais conhecidas do Fórum, tendo a seu cargo o Gabinete de Apoio ao Secretariado Permanente, sedeado na RAEM.
Nascida e criada em Macau, domina fluentemente cinco línguas: português, chinês, inglês e francês. Quando foi convidada para ser a coordenadora do Gabinete de Apoio ao Fórum – então exercia o cargo de administradora do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais – achou “um pouco estranho”, uma vez que “era algo de abstracto, que partia do zero”. Mas passados estes três anos sente-se gratificada e feliz porque se trata de um trabalho que condiz com a personalidade de alguém que sempre gostou de trabalhar em áreas com contacto com outros países. Por outro lado, sendo macaense, estar neste órgão combina bem com uma pessoa que carrega consigo a cultura portuguesa e a cultura chinesa.
Apesar de algumas dificuldades iniciais, Rita Santos cedo notou que este projecto tinha tudo para ser bem sucedido, dado que houve desde logo uma grande disponibilidade de todas as partes em contribuir para o Fórum: “Tive o apoio de muita gente logo desde o início: da China, dos embaixadores e governos lusófonos, das associações comerciais das nações de língua portuguesa e, claro, do governo da RAEM”.
O facto de a população de Macau, em especial as comunidades de língua portuguesa, ter abraçado o projecto também a satisfaz. “Verifico que as comunidades lusófonas acolheram bem esta iniciativa, até porque lhes dá outra relevância no contexto da RAEM”.

Macau transregional

Este ano, a Feira Internacional de Macau (MIF – Macao International Fair) tem características diferentes. Desde logo, ao contrário do que aconteceu em anos anteriores, não se realizará em Outubro, mas sim entre 23 e 26 de Setembro, na Torre de Macau. E isso acontece com o objectivo de fazer coincidir a MIF com o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa.
Tendo como tema, “Promover a cooperação económica transregional, acolhendo novas oportunidades de desenvolvimento”, a 11ª edição da feira procura tirar proveito de todas as ligações especiais que a RAEM tem, fazendo convergir no território empresários chineses ultramarinos, do Continental e dos países lusófonos.
A FIM ambiciona assim tirar proveito do carácter transregional de Macau, um território que assume cada vez mais o seu papel de plataforma de ligação entre duas dinâmicas de cooperação económica e comercial: por um lado fazendo parte da Região do Grande Delta do Rio das Pérolas; por outro sendo a sede do Secretariado Permanente do Fórum de Cooperação Económica entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Neste contexto, as facilidades ao nível das trocas comerciais e investimentos cruzados inscritas no “CEPA – Acordo de Estreitamento das Relações Económicas e Comerciais entre o Continente Chinês e Macau fazem com que a RAEM tenha um ambiente especial para concretizar negócios. É com esta perspectiva que o Instituto para a Promoção do Comércio e Investimento de Macau (IPIM), entidade organizadora do evento, pretende criar todas as condições para um aumento do intercâmbio entre as delegações empresariais presentes. Nesse sentido, além de organizar encontros empresariais, bolsas de contactos e zonas de transacção, o IPIM vai sistematizar uma base de dados – que será disponibilizada na Internet – sobre oportunidades de negócios e novos projectos empresariais que surjam.
No interior do Centro de Exposições da Torre de Macau vão ser colocados 320 stands de exposição, sendo que existirão duas zonas temáticas: o Pavilhão de Exposição dos Produtos de Macau e o Pavilhão de Exposição dos Países de Língua Portuguesa.
Paralelamente vão ter lugar conferências e fóruns de debate, com destaque para o “4º Fórum (Macau) sobre o Desenvolvimento das Empresas Privadas da China”, no qual vão estar presentes empresários e analistas de mercado chineses.