Cativar investimentos para Angola

Diplomático para a China. Desta vez para Macau. O novo cônsul-geral de Angola, Rodrigo Pedro Domingos tem uma missão bem clara: convencer os investidores a apostar no seu país, um mercado ainda “virgem”. Na RAEM, o enfoque está a ser dado ao café e à madeira

 

Rodrigo Pedro Domingos está há pouco mais de meio ano em Macau, onde chegou para abrir o consulado-geral de Angola na região administrativa especial, que se torna no terceiro posto diplomático do país na China, depois da embaixada de Pequim e de outro consulado em Hong Kong. Preocupado em cativar investimentos para o seu país, que diz estar “ainda virgem”, o diplomata olha também para o relacionamento da China com os países de expressão portuguesa e salienta que é uma relação “win/win”.

 

Interesse pelo mercado chinês

 

“Nós somos um mercado de 200 milhões de pessoas, já somos um mercado considerável e o contrário é ainda mais verdadeiro porque a China, com 1300 milhões de pessoas, é um mercado enormíssimo”, salienta, explicando que “hoje em dia não há nenhum país que não se interesse pelo mercado chinês”.

Por tudo isto, é um “interesse legítimo e natural” da China sobre os países de língua portuguesa e é preciso entender que a “China é um gigante e procura inserir-se no mundo dos negócios e das relações com todos os países do mundo e nós, lusofonia, somos um grupo, mas somos mais um (grupo) com quem a China se relaciona nos seus interesses”, afirmou.

 

A China compra tudo

 

No que toca a Angola, o diplomata garante que o país “faz o melhor que pode para manter as melhores relações com a China” e recorda que Pequim deu “facilidades financeiras numa altura em que existiam dificuldades em encontrar apoios junto de instituições mais vocacionadas para essas operações” e que, em troca, Angola vende “bastante petróleo”, tanto que já é o seu “principal fornecedor”.

“E quando estivermos a produzir gás, provavelmente também vamos vender gás”, sustenta, recordando que as transacções entre Luanda e Pequim incluem ainda diamantes, granitos e que o consulado de Macau está a tentar explorar outras áreas como a madeira e o café.

“A China compra tudo. Normalmente fala-se dos sectores mais importantes, como o petróleo e diamantes, mas também vendemos granitos e estamos interessados em vender mais e em diversificar mais as relações comerciais”, garante.

Mas se Angola, o Brasil e Portugal realizam esforços visíveis, Rodrigo Pedro Domingos considera que a lusofonia “não anda à mesma velocidade” ou não se esforça da mesma maneira no relacionamento com a República Popular da China. “Gostaríamos é que todos os membros da Lusofonia fizessem os possíveis para acertar o passo connosco porque funcionaríamos melhor como bloco”.

“Até diria mais: transformaríamos Macau na capital da Lusofonia. São sonhos, talvez Portugal não pense assim mas era uma questão de concertação porque a República Popular da China teria muito a ganhar com isso e a lusofonia também”, assinala.

A criação do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial Entre a China e os Países de Língua Portuguesa, o apoio à comunidade angolana que “não sendo muito grande já justifica uma presença consular para tratar dos assuntos jurídico/consulares” e a captação de investimento para a reconstrução do país são as três razões fundamentais que levaram o governo de Luanda a criar um consulado em Macau, revela Rodrigo Pedro Domingos.

“Já existe essa dinâmica entre a China e Angola, mas não concretamente com Macau e por isso achámos que Macau também podia contribuir especificamente nesse processo de reconstrução”, sublinha, salientando que há “algumas ideias que estão a ser alinhavadas”, enquanto outros projectos em áreas como o sector bancário ou até nos biocombustíveis estão a avançar.

Rodrigo Pedro Domingos está, no entanto, disponível para analisar todos os projectos que lhe sejam apresentados, já que considera que as iniciativas dos investimentos terão de partir dos interessados.

“As empresas que estiverem interessadas em investir em Angola são aqueles que vão merecer o nosso interesse e apoio, já que vamos analisar todos os projectos que nos forem apresentados”, garante.

 

*Agência Lusa, Macau

 

Os projectos da Geocapital

 

A Geocapital tem um plano de investimento de 40.000 milhões de dólares a dez anos para a produção de biocombustíveis em Moçambique, Angola e Guiné-Bissau, um projecto que vai abranger uma área de milhares de quilómetros quadrados, dar emprego a muitos trabalhadores, ao mesmo tempo que não ocupa terra destinada à produção alimentar.

O combustível da Geocapital será produzido com recurso à jatrofa (jatropha curcas) – também conhecida como pinhão-manso – e que é uma planta não comestível, comum em África e na América, e, segundo especialistas, será o meio que proporciona maior fiabilidade e o melhor rendimento de produção de biocombustíveis.

Com um objectivo temporal de dois a três anos para o início da produção – logo que a jatrofa permita a sua utilização -, na sua capacidade máxima a Geocapital, que em Angola está associada à petrolífera Sonangol, espera produzir anualmente 14 milhões de toneladas de biocombustível, equivalente a cerca de dez por cento da produção mundial.

E para os mais receosos da ocupação de terra destinada à produção alimentar no projecto, é a própria empresa a garantir que nenhuma terra da produção agrícola tradicional está incluída no investimento.

Apesar da empresa ter confirmado o projecto, as autoridades angolanas negaram conhecer o projecto, reacção que Rodrigo Pedro Domingos explica com a “contenção” do director nacional que “não se pode dizer que se desconhece”.

“Acho que é um projecto que vai para a frente pelos montantes envolvidos e pelos próprios actores do projecto”, explica Rodrigo Pedro Domingos.

A Geocapital – Investimentos Estratégicos tem sede em Macau e planos de produção e comercialização de biocombustíveis em todos os países de expressão portuguesa onde já desenvolve actividades, nomeadamente em Angola, Brasil, Guiné-Bissau e Moçambique.

 

J.C.S.

 

Criador de consulados

 

Rodrigo Pedro Domingos nasceu em Luanda em 1944, no bairro Operário. Cumpriu os estudos primários e foi para o Liceu Salvador Correia, onde concluiu o sétimo ano que lhe dava acesso à formação em Direito. “Faltaram os meios” e acaba a cumprir o serviço militar em vez de prosseguir os estudos em Portugal. Forma-se no Huambo ,é colocado em Luanda e vai trabalhar para a Câmara Municipal da capital angolana, onde entra como aspirante e faz o curso de topografia de agrimensura. Muda de serviço ingressando na Junta Autónoma de Estradas e depois nas Obras Públicas, “até que se deu o 25 de Abril” que lhe muda a vida e a carreira de funcionário do Estado.

“Os colegas e amigos que vieram da guerrilha e do exterior pediram-me para integrar um grupo para uma formação rápida na Jugoslávia no domínio da diplomacia e assim integrei o quadro do Ministério das Relações Exteriores em Outubro de 1976”, conta.

“Fui chefe da divisão das organizações internacionais, da Ásia e lembro-me que a Ásia estava ligada à América Latina o que não achei piada nenhuma e logo ali lutei pela “independência” da região e mais tarde fui colocado em Moscovo onde fui conselheiro da embaixada de 1981 a 1984”, desfia, ao contar o percurso diplomático.

No regresso a Luanda, é chamado para uma comissão de serviço no Secretariado do Conselho de Ministros e fica com a incumbência de criar o que é hoje o Instituto Nacional da Administração Pública por onde fica seis anos a cumprir a nomeação presidencial.

Depois segue outros seis anos para o Instituto Nacional de Bolsas de Estudo e só quando termina a segunda comissão de serviço é que regressa aos quadros do Ministério das Relações Exteriores.

Inicia então um percurso na direcção dos Assuntos Jurídicos e Consulares, é nomeado director para a Europa e depois para a América. Regressa à Europa para criar o primeiro consulado-geral de Angola na Holanda, na cidade de Roterdão e, no regresso ao país, fica 15 dias, tempo para preparar as malas para rumar ao Oriente, à Região Administrativa Especial de Macau, onde volta a criar um consulado.

 

J.C.S.