De olhos num futuro brilhante

Cada dia que passa serve para acumular experiência, não apenas sobre a Universidade de Macau mas também sobre o próprio território. Em funções desde Novembro de 2008, Wei Zhao encara o cargo de reitor como um desafio, ciente dos obstáculos e convicto de que os objectivos serão cumpridos. O futuro da instituição, diz, afigura-se “brilhante”, porque as bases são sólidas. O espírito reformista permitirá tornar a universidade numa instituição de referência

 

Completado o primeiro ano lectivo à frente da Universidade de Macau (UM), qual o balanço que faz desta experiência?

Confesso que antes de começar a exercer funções na UM não conhecia bem Macau nem a instituição. Apesar de o meu conhecimento ser muito geral, tinha ideia de que a UM era uma muito boa instituição de ensino. Desde que cheguei várias pessoas têm-me ajudado a conhecer melhor o território. Sinto que estou a trabalhar numa instituição que tem fundações muito sólidas, o que nos permite pensar que teremos um futuro brilhante.

 

Trouxe consigo um espírito reformista que se fez notar logo nos primeiros tempos como reitor. Quais são os objectivos?

Estamos a efectuar algumas mudanças na universidade com o objectivo de avançar para o próximo patamar. Estou satisfeito por ver que nesta tarefa temos o apoio tanto do pessoal da universidade como do exterior. Estas tarefas, contudo, têm de ser efectuadas passo a passo. Já estabelecemos o primeiro Colégio de Honra em Macau, que visa seleccionar estudantes academicamente talentosos e dedicados, apostando na formação de futuros líderes para a comunidade. A ideia é fornecer um ambiente de ensino melhor e com mais recursos para que os estudantes de Macau possam desenvolver o seu potencial. Por outro lado, estamos também a reformar as licenciaturas. No fundo, pretendemos redesenhar os programas, tornando-os mais abrangentes, com um ensino mais generalizado, alargando os horizontes de conhecimento dos estudantes – o que garantirá uma maior bagagem cultural e conhecimentos mais aprofundados, sem esquecer a componente técnica de cada uma das áreas.

 

Mas as reformas não se ficam por aqui…

Pois não. Criámos também uma Escola de Pós-Graduação, que não é um organismo independente mas que procura gerir e atrair estudantes graduados para a UM. Temos cada vez mais estudantes graduados, de diferentes pontos do mundo e com visões distintas, que têm feito progressos assinaláveis nas suas áreas de investigação. Daí que tenhamos optado por estabelecer uma Escola de Pós-Graduação, que nos dá a base para a criação de um sistema uniforme para integrar estes estudantes.

 

E o que tem sido feito em relação ao corpo docente?

Também reformulámos a carreira docente para que os nossos docentes possam melhorar a produtividade e a qualidade. Por exemplo, implementámos uma política em que os professores assistentes que vêm para a UM têm um prazo de seis anos para criarem as condições de ser promovidos, não lhes sendo renovados os contratos se não o conseguirem. Parece bastante cínico, mas a verdade é que nós queremos as pessoas motivadas para se valorizarem continuamente. Se não estabelecermos metas não daremos o exemplo do que queremos desta universidade. Queremos uma instituição melhor e com bons profissionais. Nesse sentido, temos também apostado no recrutamento de professores de renome, como a contratação de dois directores provenientes dos Estados Unidos da América, embora um seja de Hong Kong e o outro de Taiwan. Estamos a recrutar entre os melhores nos melhores locais.

 

Como definiria então os pilares que sustentam este espírito reformista?

De certa forma podemos falar em quatro pilares fundamentais. Um programa de licenciatura de elite, sustentado num sistema de ensino mais generalizado, num colégio de honra nas residências para os estudantes. Um corpo docente de excelência, suportado pelo recrutamento dos melhores profissionais mas também com a aposta na formação. Em terceiro lugar, estamos a caminhar a passos largos para nos tornarmos numa universidade dedicada à investigação, razão pela qual pretendemos definir certas áreas nas quais seremos identificados como uma instituição de excelência, como a macro-electrónica. Por fim, queremos ser uma instituição amiga do ambiente e eficiente em termos de custos, tendo consciência que a universidade é financiada pela população de Macau.

 

É também uma estratégia para atrair mais estudantes?

Claro. Tanto a curto como a longo prazo estamos a envidar esforços para tornar a UM mais atractiva para os estudantes do território, mas também para quem está fora. Actualmente, a universidade tem uma dimensão pequena e estamos fragilizados em alguns aspectos. Não temos um campus onde os estudantes possam praticar diferentes desportos e não há a possibilidade de termos uma licenciatura em Biologia, isto apenas para citar alguns exemplos. O certo é que no novo pólo – a construir na Ilha da Montanha – estes aspectos estão todos a ser levados em consideração. Será um campus bem complementado e com um ambiente de ensino propício para os nossos estudantes.

 

Mesmo assim estão a construir mais edifícios no actual campus?

A construção dos novos edifícios está a ser reavaliada. Já estávamos a construir as fundações quando se lançou o debate sobre a real necessidade de avançar para a construção dos novos blocos uma vez que nos vamos mudar para uma nova localização. Tanto pode ser útil a curto prazo, colmatando algumas das deficiências que sentimos, como pode não fazer sentido continuar a construção se dentro de quatro anos vamos transferir-nos para a Ilha da Montanha. Temos de analisar esta questão de forma cuidadosa e ponderada para tomarmos uma decisão inteligente e que defenda os interesses da instituição e da população. Neste momento, ainda não é possível dar uma resposta.

 

Quais serão os benefícios da mudança para a Ilha da Montanha?

Macau terá uma universidade de topo com todas as mais-valias de ser um espaço de ensino integrado. Passaremos de cinco para oito faculdades, teremos dez residências para estudantes e capacidade para gerir não só o ensino mas também o quotidiano dos alunos no novo pólo universitário. Será uma espécie de ensino integrado. Daremos também especial atenção à área de investigação de forma a atrair investigadores de Macau, Hong Kong, Zhuhai e província de Guangdong, para termos investigação de ponta e contribuirmos com resultados objectivos para a indústria e economia local e regional. Teremos um campus muito bonito, mas acima de tudo bastante produtivo.

 

E que alterações serão introduzidas no dia-a-dia da instituição?

A estrutura da UM não irá mudar, nem as directrizes de funcionamento. Porém, a escala será muito maior daquilo que é hoje em dia. Em termos específicos, além das novas faculdades e licenciaturas, haverá uma aposta em três bases de investigação científica aberta nas áreas de informação e electrónica, ciências medicinais e farmacêuticas, e energia e ambiente. O plano é ter o campus pronto em 2013 e contar com cerca de dez mil estudantes quatro anos depois de estarmos operacionais.

 

Existe a possibilidade de se estabelecer faculdades de Medicina ou Arquitectura, como por várias vezes já foi solicitado por profissionais dessas áreas?

Qualquer universidade adoraria ter uma Faculdade de Medicina. Mas é preciso ter consciência que uma faculdade deste género implica custos elevadíssimos. Neste momento não existe nenhum projecto para termos uma Faculdade de Medicina. O mesmo se aplica a Arquitectura. É claro que Macau pode ser bastante interessante em termos arquitectónicos, mas a partir do momento em que se cria uma licenciatura é preciso saber quais serão as saídas profissionais. Nós temos de ter a certeza que os nossos cursos estão em consonância com a procura de mão-de-obra e o desenvolvimento da sociedade de Macau.

 

Já há ideia de quanto irá custar o projecto?

Vamos falar em números. O ano passado, a população de Macau doou 5,5 mil milhões de patacas para a recuperação de Sichuan. Este ano, o plano pecuniário do Governo atingiu os três mil milhões de patacas. Se pensarmos que estamos a investir no futuro do território, qual deverá então ser o valor a despender para a construção do novo pólo da UM? O que quero dizer com isto é que há dinheiro para investir. Penso que é razoável se gastarmos algo semelhante ou até um pouco mais na construção do campus da Universidade de Macau. Um valor entre os cinco e os dez mil milhões é exequível, para construir uma universidade como pretendemos. Menos que isso se calhar não será suficiente. Mais, se calhar será um desperdício de fundos públicos. Porém, ainda não é possível avançar com números precisos.

 

O que irá depois acontecer às actuais instalações?

O Governo é o proprietário das infra-estruturas da UM. Nós pedimos ao Executivo que permita à universidade manter este pólo, porque acreditamos que estas instalações podem ser bastante úteis para diversas actividades ligadas à universidade, como o programa de educação contínua, ou mesmo para investigação.

 

E como responde às vozes críticas à mudança da UM para a Ilha da Montanha?

Espero que as pessoas percebam que o projecto prevê que um terreno da Ilha da Montanha ficará sob jurisdição de Macau, onde se aplicará o sistema judicial da RAEM e que terá entrada directa e sem obstáculos para os residentes de Macau. Deste ponto de vista, poder-se-ia até dizer que não é a UM que se vai transferir para a Ilha da Montanha, mas sim um pedaço da Ilha da Montanha que vai passar a pertencer a Macau. Não estaremos fora de Macau, não haverá obstáculos fronteiriços, continuará a conduzir-se à esquerda, haverá uma sucursal do Banco Nacional Ultramarino, e a instituição será bem visível porque estará aqui ao lado. Tudo isto tendo sido já bem explicado, acho que não há mais razão para receios.

 

Como reitor da mais antiga instituição de ensino superior da RAEM, como vê o sistema de ensino no território?

Apesar da minha curta experiência em Macau, já deu para perceber que há um grande investimento na educação. No ensino superior existe um conjunto de instituições muito diversificado, o que é muito bom. Recentemente, os reitores e directores das diferentes instituições começaram a estreitar os laços de cooperação, para que não haja duplicação nem falta de recursos. Estamos no bom caminho.

 

Mas será que dez instituições deste género não são de mais para um território como Macau? 

O sistema de Macau está bem estruturado mas ainda está em evolução. É um processo normal noutros pontos do mundo e Macau não é excepção. À medida que o tempo passa vamos sentindo a necessidade de introduzir ajustamentos. Há trinta anos não havia nenhuma universidade, agora há dez instituições. Daqui a outras três décadas, poderemos ter o dobro ou apenas cinco. Trata-se de um sistema em constante evolução.

 

Wei Zhao, o reitor estudante

 

Chegou há pouco mais de um ano ao território para ser o novo timoneiro da Universidade de Macau. Trouxe novas ideias e um espírito de reforma. Contudo, e apesar do pouco tempo livre, o reitor confessa que continua a ser um estudante. A aprendizagem é um processo contínuo, especialmente quando ainda há tanto para descobrir sobre Macau

 

Não foi por acaso que veio parar a Macau. A vontade estava lá, e teve de passar por um criterioso processo de selecção para chegar a reitor da Universidade de Macau (UM). Wei Zhao é hoje o oitavo reitor da mais antiga instituição de ensino superior da RAEM, mas foi o primeiro professor catedrático de mérito da UM – no Departamento de Computadores e Ciências da Informação.

O percurso até chegar a Macau foi feito de muitas viagens, “um meio excelente para acumular experiência”, mais-valia essa que faz parte da sua “bagagem”. Zhao licenciou-se em Física na Universidade Normal de Shaanxi, na China, em 1977, e na década de 80 fez parte do contingente de jovens estudantes que, na senda das reformas e abertura da República Popular da China, seguiram para o estrangeiro para prosseguir os seus estudos ou carreiras profissionais. Os Estados Unidos da América foram o destino escolhido, e poucos anos depois obtinha os graus de Mestre e Doutor em Informática e Ciências da Informação nas Universidades de Massachusetts e Amherst.

Na sua carreira académica, foi docente na Universidade Normal de Shaanxi, no Amherst College, na Universidade de Adelaide e na Universidade do Texas, tendo até desempenhado cargos de direcção na academia e no governo federal norte-americano. São histórias do passado, mas ”descanso” continua, por enquanto, a ser uma palavra com pouco uso no dicionário deste reitor.

Durante a sua estadia nos EUA, o professor Wei Zhao manteve-se activo na organização e promoção de actividades de intercâmbio sino-americano, nas áreas da educação e da investigação científica. Uma ligação que não quer perder, especialmente pelos laços que criou ao longo dos vários anos em que esteve em território norte-americano.

Apesar de despender a maior parte do seu tempo nas funções do actual cargo, não esconde que continua um atento observador do que se vai passando no seu campo de ensino e investigação. Mesmo com menos tempo, não quer deixar de participar em conferências e de escrever artigos, contribuindo com os conhecimentos que foi adquirindo ao longo dos anos. Só lamenta que as horas não sejam suficientes para cumprir todos os sonhos.

Porém, há outro trabalho de casa que tem de ser feito. Daí que Wei Zhao diga que ainda é um estudante. Desde que chegou ao território tem acumulado livros sobre Macau. Da história à cultura, passando pela política e pela economia… “Nada me escapa”, confessa o também amante de música clássica. Não se trata de uma corrida contra o tempo. É antes uma oportunidade para recuperar o tempo perdido, passando a conhecer melhor o território que hoje o acolhe. “As minhas prateleiras crescem ao ritmo de dois livros por semana”, conta, revelando que a maior parte das obras são recomendadas por amigos e colegas. “Todos me ajudam a conhecer melhor Macau.”

Como os dias não são feitos apenas de trabalho e estudo, sempre que pode o reitor da UM ruma às colinas ou à piscina. Caminhar pelos trilhos, ou nadar, “é do melhor que há”. “Não apenas faço um pouco de exercício, como também é bastante bom para relaxar e aliviar o stress do dia-a-dia.” A meta pessoal é fazer isto três vezes por semana. “Mas o dia é curto”, reitera.

É que não só as funções de reitor ocupam grande parte do dia, como Wei Zhao está pessoalmente comprometido com o espírito reformista que imprimiu à universidade desde que chegou.

Os exemplos vão-se acumulando: desde a implementação de um programa de investigação pelos estudantes de licenciatura ao estabelecimento de uma série de iniciativas para o desenvolvimento do pessoal docente.

A meta está bem traçada na sua mente. “Promover a posição académica, a excelência do ensino e o nível de reconhecimento da UM no mundo inteiro” – proclama, sem receios.