Ensino superior lusófono ganha força

O Instituto Politécnico de Macau foi o palco da conferência que juntou figuras de topo do ensino superior dos países e regiões onde se fala português. Sob chancela da associação FORGES, debateram-se estratégias e marcaram-se objectivos ambiciosos

 

Macau, Forum Educação

 

Texto Nuno G. Pereira

 

Fazer do ensino superior lusófono uma força também superior é o principal objectivo do Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa (FORGES). Constituído por figuras prestigiadas de inúmeras instituições de ensino, esta associação deu um passo decisivo para o seu crescimento com a realização da 2.ª Conferência. A reunião decorreu nos dias 6, 7 e 8 de Novembro, em Macau.

A escolha do local teve um simbolismo particular, como explica Luísa Cerdeira, docente da Universidade de Lisboa e dirigente do FORGES. “Há outras estruturas que dizem ‘países de língua portuguesa’, mas nós fizemos questão de pôr ‘países e regiões de língua portuguesa’ na nossa sigla. Macau é um ponto em que nos reconhecemos, na tradição e na cultura, e tem duas pujantes instituições de ensino superior: a Universidade de Macau (UM) e o Instituto Politécnico de Macau (IPM). O próprio IPM, na figura do professor Lei Heong Iok, ficou na direcção do FORGES e por isso vai acompanhar os trabalhos desta rede. Tem um papel activo, porque no fundo as questões da gestão do ensino superior em Macau são também questões que vão enriquecer este nosso espaço de debate.”

Depois da 1.ª Conferência, onde o projecto ganhou dinâmica, realizada nas universidades de Lisboa e Coimbra, o novo encontro elegeu os corpos sociais do FORGES para o próximo triénio e marcou novos objectivos. Acima de tudo, mantém-se a ideia inicial de desenvolver uma rede activa e eficaz. “Vamos continuar a fazer a consolidação do FORGES, a ganhar mais sócios individuais (professores e pessoal não docente), assim como a adesão de mais instituições de ensino. Queremos discutir as políticas e as questões que se colocam aos estabelecimentos que gerem o ensino superior. Para isso vamos dar continuidade à organização anual de uma conferência, promover a publicação e a elaboração de artigos científicos, organizar a primeira visita de estudo entre instituições (deverá ser em Lisboa) e outras actividades de formação. O trabalho será estruturar e alargar esta rede no espaço dos países que falam a língua portuguesa.”

 

Três ideias fortes

A 2.ª Conferência do FORGES teve como título “Por um Ensino Superior de Qualidade nos Países e Regiões de Língua Portuguesa”, centrando-se em três aspectos: políticas públicas de desenvolvimento e de reforma do ensino superior; financiamento e internacionalização do ensino superior no contexto da globalização, e avaliação e garantia da qualidade do ensino superior.

No balanço do encontro, Luísa Cerdeira salienta que as linhas gerais em discussão foram muito enriquecedoras. “Há uma grande preocupação com a garantia da qualidade, em perceber como é que se pode crescer respeitando este compromisso. Muitos países precisam de aumentar o seu nível de escolarização e dar acesso a camadas mais alargadas da população, fazendo-o ao mesmo tempo que promovem a qualidade. Para tal, faz sentido associar educação, formação e investigação científica.”

Em relação ao financiamento e à internacionalização, afirma que muitos países procuram encontrar modelos de afectação de recursos mais objectivos. “Moçambique, por exemplo, apresentou um modelo de financiamento que pode dar clareza à forma como são aplicados os recursos públicos. A discussão centrou-se muito neste ponto: como e em que quantidade deve a riqueza de um país ser aplicada na área da educação.”

As políticas públicas de apoio ao desenvolvimento, “uma matéria muito presente e necessária em todos os países”, constituíram o terceira tema debatido. Apesar das dificuldades económicas que alguns países enfrentam, uma nota obteve unanimidade: “é preciso continuar a apostar no desenvolvimento e na educação”.

A 3ª Conferência do FORGES, em 2013, ficou marcada para Pernambuco, no Brasil.

 

Assim nascem parcerias

É um objectivo do FORGES apontar para a uniformização do ensino superior dos países de língua portuguesa? Luísa Cerdeira rejeita a terminologia, embora adiante que a mobilidade entre licenciados de diferentes países lusófonos é importante. “A língua obviamente é um denominador comum, mas não gosto da palavra uniformizar. Não tem que ser tudo igual. O que podemos ter, e foi um repto aqui lançado como tema para a próxima conferência, é a forma de reconhecimento dos graus e de acreditação dos cursos. Alguém que é licenciado em História em Macau, por exemplo, deve ter o seu grau reconhecido noutro país. Alguns dos oradores colocaram o problema. Contudo, a solução está na esfera do decisor político e ultrapassa o âmbito do FORGES.”

De qualquer maneira, não é um problema sem solução. “Já há formas de ultrapassar a questão, através de programas e cursos de dupla titulação, em que os alunos ficam com o grau nas duas instituições que estão em parceria. Teremos que trabalhar no sentido de obter outras soluções, para haver confiança nos diversos sistemas de ensino e ver como é que a acreditação pode ser conseguida. É um dos temas na ordem dos trabalhos para o futuro.”

Entre os diversos países e regiões da lusofonia há diferenças, como é óbvio, nomeadamente no que diz respeito ao estado do seu ensino superior e à capacidade económica. O FORGES pode ser um dinamizador de apoios e parcerias, ao estabelecer uma rede em constante desenvolvimento.

“O pôr em contacto é sempre a primeira ajuda, quando nós conhecemos o outro. Há projectos de investigação que podem ser feitos a partir daí, quando se fecham portas de financiamento de um lado podem abrir-se de outro. Tivemos aqui, por exemplo, membros dos governos de Angola e Moçambique, quem sabe não surge um intercâmbio, associando investigadores e parceria de financiamentos.”

Falar em troca de know how por financiamento é uma abordagem demasiado simplista, mas uma parceria só pode resultar com vantagens para todas as partes envolvidas. “Portugal e Macau possuem uma taxa de escolarização de ensino superior bastante alta. Por isso, têm formação de pessoal docente e de investigação de alto nível, que pode ser um instrumento para outros países. Mas são esses países que sabem o que lhes interessa. O nosso objectivo é pô-los em contacto, incentivar a colaboração, ser um facilitador nessa matéria. Não somos uma agência de financiamentos nem de colocação de projectos, mas é natural que surjam parcerias, as redes formam-se assim. Por exemplo, se conheço um colega moçambicano que está a estudar algo da mesma área científica que eu, posso convidá-lo para concorrermos juntos a um apoio da União Europeia. O contacto facilita isso.”

 

Rede de qualidade

O FORGES foi criado, segundo o seu documento de apresentação, como resposta ao crescimento do ensino superior nos países e regiões onde se fala o português. “Perante este crescimento, um desafio central que se apresenta para os próximos anos é o de desenvolver e implementar políticas de qualidade na gestão das instituições de ensino superior, de modo a melhorar as condições de produção de ensino e ciência e o incremento da empregabilidade dos estudantes.”

A associação pretende ser um pólo dinamizador de relações entre protagonistas do ensino superior, estabelecendo-se como um fórum privilegiado de contactos. “Pretende-se consolidar uma rede, que articule e faça comunicar os membros dos órgãos de gestão das instituições de ensino superior, técnicos e responsáveis da administração ligada às instituições de sector, bem como os investigadores cujo objecto de estudo sejam as políticas do ensino superior, principalmente no espaço dos países e regiões de língua portuguesa, que contribuam para a realização qualificada de transformações reformistas e inovadoras.”