Monumentos eternos

Mina, Dina, Bela e Guiomar Pedruco são património vivo da RAEM – as únicas quatro irmãs a vencerem um concurso de Misses exibem uma beleza à prova do tempo. Quase 25 anos após a primeira tiara, contam a sua história, actualizada com mais casamentos do que filhos. E muito trabalho, que estas Misses nunca quiseram ser “dondocas”

 

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Texto Nuno G. Pereira | Fotos Gonçalo Lobo Pinheiro

 

Já ouviu a história da candidata a Miss que chorou porque partiu uma unha? Da que suspirava entre desfiles pelo príncipe endinheirado que nunca mais aparecia? Ou ainda daquela tão obcecada em ganhar que nem as orelhas poupou à cirurgia plástica? A história do triunfo sem paralelo das irmãs Pedruco não tem nada disto, pulverizando clichés de concursos de beleza.

As manas assumem-se como marias-rapazes. Da infância à adolescência, nada de vestidos e batons, era mais desporto e até ocasionais cenas de pancadaria. Mas a mãe percebeu que a beleza delas seria o passaporte para deixarem de distribuir nódoas negras. Victoria Pedruco sabia que tinha um póquer de damas na mão. E que era altura de ir a jogo.

Guilhermina, a mais velha, foi a primeira cartada bem sucedida. Mina não só passou com distinção na nota técnica da feminilidade, como brilhou ainda mais na nota artística – em 1989, então com 19 anos, mostrou como se ganha tiara, ceptro e faixa.

 

 

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Mina de ouro

Mina já conhecera o primeiro lugar do pódio. No karaté, as suas performances encheram-na de medalhas, com o ponto alto a suceder numa competição internacional no Japão, onde arrebatou ouro a duplicar. Embora já não se lembre bem. “Comecei com 12 anos. Tenho muitos troféus, certificados, mas não sei onde está nada disso. Se calhar foram para o lixo (risos). Fui campeã no Japão com 14 ou 15 anos, ganhei em combate e kata [modalidade de execução de golpes sem adversário].”

O desprendimento com que fala dos êxitos no karaté é o mesmo com que refere ter sido Miss. Aliás, tanto ela como as irmãs. Uma genuína e desconcertante atitude. “Foi uma experiência engraçada, mas é passado” são palavras comuns às quatro irmãs, pouco impressionadas com o seu feito. Mina dá ainda menos importância. É que nem só os troféus do karaté andam desaparecidos. “A faixa já estava amarela e deitei-a fora. A tiara e o ceptro não sei onde estão (risos).”

O karaté acabou quando ela tinha 18 anos. “Deixei por causa do meu namorado, era muito ciumento. Mas como estava mergulhada nesse amor, também não foi difícil. Gostava mais dele do que do karaté (risos).” Sendo ciumento, não ficou aborrecido por vê-la concorrer a Miss Macau? “Não podia, a sugestão veio da minha mãe, com quem se dava bem. Aliás, era o único dos genros de quem ela gostava (risos).”

A mãe incentivou Mina a concorrer a Miss Macau para ser mais feminina. “Nunca tinha andado de saltos altos. Nós as quatro éramos muito maria-rapazes, nada de saias ou maquilhagem. Aprendemos e ficámos a gostar, embora ainda hoje tenha preguiça de me maquilhar (risos).”

Apesar de tudo, teve a tarefa mais fácil – foi a primeira, não havia comparações. “Estava calma, não tinha pressão para ganhar. Ainda assim, na noite do concurso, tive uma infecção num dos olhos e só pude usar uma lente de contacto. Estava como Camões, mas tinha de disfarçar. Umas horas antes, combinei com o bailarino que ia levar-me pelas escadas para me agarrar bem. No palco, como não era a descer, o desfile tornava-se mais fácil. Quando fizeram as perguntas, evitei olhar para a câmara, porque tinha o olho muito vermelho.”

Nada, porém, que a perturbasse. Quando anunciaram o nome da vencedora, garante que se manteve descontraída. “Não fiquei assim surpreendida, tipo “ah, eu, eu?!?”. Foi mais “ai é?, ok está bem”. Não chorei, estava calma. O que realmente me surpreendeu foi darem-me o prémio de Miss Fotogenia. Não gostava de tirar fotos na altura e continuo igual (risos).” A família vibrou com o triunfo. “Deviam estar mais confiantes do que eu, porque já tinham reservado restaurante para jantarmos a seguir.”

A confiança tinha razão de ser, porque Mina era apontada como favorita. “Até os jornais diziam isso. Foi a partir daí que umas conhecidas, que também participaram, ficaram mesmo invejosas. Diziam às outras que eu ia ganhar Miss Fotogenia e Miss Macau, por isso não podiam votar em mim para Miss Simpatia.”

Fora de portas, no Miss Mundo, ficou um pouco desolada porque a competição foi em Taiwan e em Hong Kong, onde se realizaram os desfiles finais. Ou seja, perto de casa, sem aquelas viagens distantes tão apetecíveis. Apesar de estar no Miss Mundo ainda com menos pressão, pelo maior número de concorrentes, sentiu que o concurso podia ter decorrido de outra forma. “Pessoas da organização disseram-me que o meu nome estava no grupo de finalistas, mas que o retiraram para pôr lá a Miss Tailândia, cujo patrocinador contribuía com muito dinheiro para o concurso.”

O Miss Chinesa Internacional – outra competição com acesso garantido pela vitória no Miss Macau – trouxe nova alegria. Mina ficou em terceiro lugar, ainda hoje a melhor classificação de Macau nesse concurso para Misses de ascendência chinesa. “Fui Segunda Dama de Honor, porque não havia mesmo melhor (risos). Voltei a ser a favorita, os jornais falavam nisso em Hong Kong, onde também foi a final. Ganhou a Miss Austrália, cujos representantes faziam parte da organização, e a Primeira Dama de Honor foi a Miss Hong Kong, que jogava em casa.”

Entre os prémios estava a participação num filme produzido em Hong Kong. Foi o primeiro de uns quantos, mas a carreira terminou cedo. “Detestei todo o ambiente. Demasiados jantares, muita falsidade, horários trocados. A própria representação também me entusiasmou pouco. Ser actriz não era para mim.”

Quando foi Miss Macau, representar o território, em actividades coordenadas pelos Serviços de Turismo, era parte do prémio. Interrompeu os estudos, mas depois foi para Inglaterra fazer um curso de turismo. Regressou e foi secretária no Leal Senado. Já depois da transição, manteve-se como funcionária pública. Conciliando trabalho e família, tirou a licenciatura em Administração Pública. Abriram-se oportunidades, que aproveitou. Há já alguns anos, trabalha na Divisão de Higiene Ambiental do Instituto para os Serviços Cívicos e Municipais.

A família é o seu pilar. A começar pelo “namorado ciumento”. “Casei-me em 1995. Namorámos seis anos, mas já o conhecia desde os dez, fomos colegas de escola. E um pouco de ciúme nunca fez mal, é sinal que gosta muito de mim (risos).” Têm dois filhos, um rapaz com 17 e uma rapariga com dez. Será a próxima Miss Macau da família? “Se quiser participar nada tenho a opor. Acho que vai gostar. Saiu ao contrário da mãe e das tias, é muito vaidosa. Combina todas as peças quando lhe peço para se vestir para sairmos. É brilho por todo o lado (risos).”

 

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Bela até no nome

Só quatro anos depois houve outra Pedruco como Miss Macau, porque Geraldina, a segunda mais velha, não estava para aí virada. Em 1993, a nova eleita foi a mana seguinte, Isabela, então com 20 anos. “A minha mãe incentivou-me, mas achei graça. Eu e a Guiomar já tínhamos feito trabalhos de moda, por isso foi mais fácil participar. Adoro a sensação de ter o coração a bater antes de subir ao palco. Ainda hoje, quando participo no teatro do patuá, gosto disso.”

E a sombra de Mina. O que faria Bela se perdesse? “Havia de facto um bocadinho de pressão por causa da vitória dela. Mas liguei pouco. Se não ganhasse, ia estudar para fora (gargalhada).”

Recorda o Miss Macau como um momento agradável, mesmo antes de saber que iria ganhar. Adorou a preparação, o convívio e a oportunidade de viajar até à Coreia do Sul, onde as concorrentes fizeram filmagens promocionais. “Em geral o ambiente era bom, mas com um grupo de mulheres juntas há sempre coisas. Fiquei muito desiludida com uma amiga que conhecia desde a escola primária. Também concorreu e distanciou-se de mim, começando depois a difamar-me. Uma tristeza.”

Foi-se a amiga, ficou o tesouro – imune à má-língua, Bela ganhou o Miss Macau, juntando ao título, tal como fizera Mina, a distinção de Miss Fotogenia. Perante júri, público e família, desfilou confiante para a segunda vitória das Pedruco. E se não chorou na hora da consagração, rir teve um preço. “Recordo bem o sorriso que tinha. Era tão automático que já me doíam os músculos dos maxilares. As bochechas até tremiam (risos)!”

No seu ano, foi a Primeira Dama de Honor a ir ao Miss Chinesa Internacional, mas o passeio motivado pela participação no Miss Mundo mais do que compensou. “Uma maravilha! Foi em Sun City, na África do Sul, adorei. Umas belas férias, sem qualquer pressão.” Algumas candidatas, porém, não estavam lá para ver as vistas. “Há sempre umas com a mania que são melhores. Isso aconteceu com a Miss EUA e a Miss Venezuela, países que ganharam várias vezes no passado.”

Antes de irem para a África do Sul, as candidatas passaram por Londres. “Na madrugada em que estávamos no hotel, tocou o alarme de incêndio. Disseram para sairmos depressa, mas nem percebi, estava cheia de sono. A Miss Hong Kong, que dividia o quarto comigo, insistiu para eu acordar, o barulho continuava e fomos ver o que era.” O resultado foi uma imensidão de Misses de roupão? “Quase. Levaram-nos para outro hotel, onde esperámos num salão. Só trouxe um casacão quente (estava frio em Londres) e uns chinelos. Mas algumas já lá estavam todas arranjadas, com chapéu, maquilhadas, sei lá! Eu, na iminência de um incêndio, quis foi despachar-me o mais depressa possível, mas outras puseram a aparência em primeiro. A Miss América era a que mais se dava ares. ‘I am a beauty queen!’, gritava, dizendo que não podia passar por aquilo (risos).”

Com o apartheid perto do fim, o concurso acompanhou o ponto de viragem na África do Sul. A vencedora local tinha sido a primeira negra a ser coroada Miss África do Sul, ganhando depois o posto de Primeira Dama de Honor no Miss Mundo. E a grande vencedora foi a Miss Jamaica, também de ascendência africana.

Bela foi a única das irmãs que não quis tirar um curso em Inglaterra, concluindo os estudos na sua terra. Depois do ano dedicado a representar Macau, foi trabalhar na Air Macau, onde a sua beleza também se destacou. “Voltei a participar num concurso de beleza, em 1996, para assistentes de bordo – o Miss Interline – onde ganhei Primeira Dama de Honor.” Mais tarde, o amor influenciou o trabalho. “Há cerca de sete anos, fui viver com o meu ex-marido para Hong Kong, onde trabalhei no Consulado de Angola. No ano passado vim para Macau, onde abri um salão de estética masculina.”

Após dois casamentos, está agora solteira. Um homem precisa de muita autoconfiança para ser casado com uma Miss? “Nada disso, nunca foi um factor nas minhas relações. O que conta é a personalidade.”

Sobre o estigma de beleza e inteligência não conviverem, afirma que nunca enfrentou o preconceito. Nem as irmãs. “O que sentimos mais é as pessoas pensarem que, por termos sido Misses, não precisamos de trabalhar. Como se o dinheiro viesse do ar. Devem pensar que podíamos casar com um ricaço e ficar em casa sem fazer nada (gargalhada). Nunca quis tal coisa!”

 

 

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Dinamite

“Quando me perguntam se sou bonita, só digo que não sou feia. Tive sorte em ser Miss porque o júri gostou do nosso tipo de beleza. Mas há outras mulheres com outros tipos de beleza.” As palavras parecem modestas, mas Dina não se preocupa em avaliá-las. Quando fala – como ela admite e as irmãs confirmam – diz o que pensa. As consequências até podem ser explosivas, mas esta “Dina-mite” sempre foi assim.

Talvez por isso, foi difícil convencê-la a participar no Miss Macau. A mãe tentou cedo – afinal, era a filha mais velha a seguir a Mina – mas Dina esquivou-se sempre. Em 1995, quando veio de Inglaterra, onde estudava Turismo, a mãe voltou à carga. No último dia possível, inscreveu-a. “Quando me contou, pensei ‘pronto, olha, já está, agora não há maneira de não ir’.”

A pressão era grande, pelos triunfos prévios das irmãs, trazendo um desequilíbrio extra ao maior desafio que a competição lhe impôs: dominar os saltos altos. Dina nunca calçara para lá do raso, com a agravante de que tinha 24 anos, mais cinco do que Mina quando foi Miss Macau. “Aprendi nas semanas que antecederam o concurso. Quando íamos tirar fotografias, em pose, parecia que eu ia cair a qualquer momento. Para a frente, para trás, caio, não caio. As pessoas a rirem, gritando “fica de pé!”, e eu ali a tentar equilibrar-me com saltos de oito centímetros… Usei saltos altos todos os dias. Só faltava dormir com eles (risos).”

A aprendizagem saiu perfeita. Dina foi eleita Miss Macau, numa vitória já então inédita de três irmãs. Quase 20 anos passados, a memória prega-lhe partidas. “Não me lembro de muita coisa (risos). Quando anunciaram que eu tinha ganho, isso sim.” Também não chorou, mas confessa que esteve quase. “Não de alegria, mas de alívio! Foi tanto stresse!”

Sobre ciumeiras, Macau foi melhor do que o passeio fora de portas. “Mulheres invejosas há em todo o canto (risos), mas no meu ano não houve problemas. No Miss Mundo é que me recordo de muitas coisas dessas. Por exemplo, tínhamos de entregar à organização as roupas com que íamos desfilar para serem guardadas. Explicaram-me que houve um ano em que as roupas ‘tinham-se estragado’. Ou seja, alguém fora cortá-las. Havia sempre dois guardas armados em frente ao quarto onde se guardavam as roupas!”

Dina participou no Miss Chinesa Internacional, em Hong Kong, mas diz que foi normal. Do Miss Mundo – também na África do Sul, de novo em Sun City – é que tem mais histórias para contar. Como ver uma candidata em intimidades com um jurado. “Antes do concurso havia jantaradas que nunca mais acabavam, com a presença dos jurados. Eram muitos, entre dez a 20, e nós tínhamos dois minutos cada uma para falar com eles. Estes jantares eram para que o júri pudesse ter um conhecimento prévio das candidatas, que eram quase 100. Numa dessas festas, eu estava num grupo com a Miss Taiwan. E ela começa “olha aquela, olha aquela!”. Eu, distraída como sempre, quando olho digo “o que está ela a fazer?”. Era uma candidata a atirar-se a um jurado! E depois saíram de mãos dadas!” Não recebeu a tiara, mas Dina revela que teve direito a distinção. “Não recebeu um prémio principal, mas foi Rainha de Continente (havia cinco).” E concorrentes emproadas? “Algumas. A Miss Filipinas… era estrábica e achava-se o máximo. Uns anos depois, vi uma foto dela na Internet e já tinha os olhos a ver para o mesmo lado (risos).”

Dina também estudou Turismo em Inglaterra, mas não concluiu. “Nunca me dei bem com os números. Fui parva, nem sei por que escolhi tal curso. Gosto mais de cabeleireiro, maquilhagem… Não em mim, gosto de fazer aos outros (risos).”

Após um ano de reinado, foi trabalhar para a TAP, enquanto existiu a linha aérea entre Lisboa e Macau. Mais tarde entrou como assistente administrativa para o Consulado de Portugal em Macau, onde está até hoje.

Fora do trabalho, confessa que se distrai com inúmeros interesses, mas que é muito volátil nestas paixões súbitas. Como a Aromaterapia, que quer ir aprender. Ou doçaria. “Há uns tempos fui aprender a fazer bolos. Estava numa fase de cupcakes. Agora já nem me lembro como se faz. Gosto de saber fazer as coisas para mandar as pessoas fazer. Detesto cozinhar, mas tenho muitos livros de culinária em casa, para mandar a empregada fazer. Sou assim, de repente gosto de uma coisa, vou aprender, a seguir gosto de outra, vou aprender outra.”

Dina tem um filho de 15 anos, do primeiro casamento, e duas raparigas, do actual. “Uma tem quatro e a outra um e meio.” Casou-se com o segundo marido em 2008. “Conhecíamo-nos desde miúdos, tínhamos andado nos escuteiros. Ele tinha a vida dele e eu a minha, mas começámos a conviver no teatro do patuá, onde eu fazia maquilhagem, depois do meu divórcio. Namorámos poucos meses e casámos logo. Para não gastar tempo (risos). Sou uma mulher muito prática.”

 

 

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Guiomar tens que ganhar

Com as irmãs coroadas, Guiomar, a mais nova, tinha o peso do mundo em cima – a família queria que concorresse, mas ela só pensava na vergonha de perder o que todas as manas tinham ganho. A mãe tentou convencê-la de várias maneiras, incluindo pura guerrilha de provocação, chamando-lhe feia, entre outras arrelias. “Porque eu era a mais gorda. Estava sempre a pedir para eu fazer dieta, que só faltava eu ganhar. Brincava, mandava umas bocas. Queria mesmo convencer-me.”

As irmãs juntaram-se à mãe. “Vá lá, é uma boa experiência, não te preocupes, vai correr bem.” Guiomar lutava como podia. “Vocês sabem que não gosto dessas coisas, sou muito maria-rapaz.” As desculpas acumulavam-se, até que ela se refugiou no último reduto: dizer que podia perder a bolsa da União Europeia, ganha para estudar Gestão Hoteleira em Inglaterra, se interrompesse o curso. A família não quis saber, mantendo-se irredutível: se era possível a quarta tiara, só esse caminho importava. Hesitante, a filha mais nova foi ter com o pai, à procura do conselho final. A resposta, que não esquece até hoje, acabou com as dúvidas. Guiomar respirou fundo e comunicou a decisão à família: ia tentar.

A partir daí, a tensão cresceu até ao momento final, carregado de boas notícias. Guiomar Pedruco completou em 1996, com 22 anos, o feito até agora irrepetível: quatro irmãs vencerem um concurso de Misses. E, apesar disso significar um ano longe do curso, acabou depois por completá-lo sem perder a bolsa. Os dias que antecederam a vitória são também uma memória saborosa. “Ganhei amigas e hoje ainda estamos em contacto.”

Nos desfiles, acredita ter conseguido disfarçar a tensão. “Quando estou nervosa começo a rir. Portanto acho que as pessoas não toparam, porque tive sempre um sorriso.” No fim, quando disseram o seu nome, soltou um enorme suspiro. “A única reacção que tive foi ‘uff, até que enfim, já está tudo resolvido’.”

Nessa festa, pela primeira vez, seria uma irmã a passar a tiara à nova Miss. “A Dina estava mais nervosa do que eu”, conta Guiomar. “Depois de ouvir o meu nome também ficou aliviada.” Dina recorda-se bem do que passou. “Tinha de sair de umas escadas, descer, dar uma volta no palco e entregar o prémio à vencedora. Havia um bailarino que me acompanhava, e eu, enquanto não se dizia quem era a nova Miss Macau, estava a apertar-lhe a gola sem me dar conta, quase aos gritos, “aaah!!!”, e ele, coitado, só dizia “calma, calma!”. Eu já lhe torcia os braços e tudo! Depois, quando anunciaram o nome da Guiomar ainda fiquei mais nervosa. O que sofreu o bailarino, coitado (risos). O que seria se tivesse de coroar outra? Felizmente correu tudo bem.”

O Miss Chinesa Internacional de Guiomar saiu-lhe bem – ficou em quarto lugar, empatada com Miss Taipei –, mas teve o senão de ser demasiado perto, ao realizar-se uma vez mais em Hong Kong. No entanto, o Miss Mundo deu-lhe uma grande viagem. Guiomar salienta apenas terem sido umas férias com bom ambiente, sem pontos negativos e, acima de tudo, sem a pressão que sentira a competir em casa. Decorreu em Nova Deli e Bombaim, mas perto do fim houve a surpresa que provocou felicidade às candidatas. “Vários grupos de associações femininas da Índia manifestaram-se contra os desfiles em biquíni. Por isso, a organização decidiu que essa prova iria realizar-se noutro sítio. E fomos todas para as Ilhas Seychelles!”

Um ano depois, já sem as obrigações da vitória e com o curso concluído em Inglaterra, Guiomar regressou a Macau, onde trabalhou em diferentes hotéis. Trabalhou ainda como Relações Públicas, que deixou, por um motivo superior: apoiar o pai. “Tinha cancro e fomos para Pequim, onde fez um transplante.” Um ano mais tarde, em 2006, estava de novo em Macau, com a sua própria empresa de organização de eventos e relações públicas.

Nessa fase, apaixonou-se pelo homem que é agora seu marido. Namoraram quatro anos e estão casados há dois. Guiomar gostava de ter filhos, mas para já partilha com o marido o gosto pelo negócio dos vinhos, que acumula com a sua empresa, entre muitas outras actividades. Como ser vice-presidente da Direcção da Associação dos Jovens Macaenses, presidente da Assembleia dos Deficientes Visuais de Macau e directora de Relações Públicas da Macau Film Production. “Gosto de estar envolvida em muitas coisas. Passa por saber gerir o tempo. Gosto de tudo o que faço.”

A antiga Miss fundou também o seu concurso de beleza. “Nada tenho contra o Miss Macau, que faz falta e deve continuar. Só que tem demasiada participação externa, nomeadamente de Hong Kong. Achei que Macau precisava de um concurso de beleza que fosse cem por cento feito por pessoas daqui, por isso criei o Macau Cover Girl.”

 

 

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O que tem de ser…

Quando o trisavô português Pedruco veio para Oriente, casou-se com a trisavó macaense Guilhermina. O apelido dele e o nome dela estariam cinco gerações depois na primeira Miss da família, mostrando a combinação das cargas genéticas vindas de Portugal e China com um êxito inédito. Houve sempre má-língua a espalhar que os júris estavam comprados, mas, como dizem entre gargalhadas as manas, “alguém acredita que fosse possível corromper a riquíssima Winnie Ho, irmã de Stanley Ho, ou Costa Antunes, director do Turismo de Macau? ”.

A mãe, Victória, morreu em 2001, e o pai, Henrique, em 2010. Ambos de doença. Ao ouvir-se as filhas falar, porém, fica a ideia de que os pais ainda estão cá, pela presença viva com que surgem nos diálogos. Em particular porque elas referem constantemente como a mãe insistia para concorrerem.

Já o pai teve sempre uma postura discreta. As filhas confirmam que ele concordava, mas não se manifestava sobre o tema, deixando que fosse Victória a convencê-las a subir ao palco. Até ao dia em que Guiomar foi ter com o pai, meia apavorada pela pressão, para lhe perguntar se achava que ela devia participar. “Citou-me uma frase de Henry Ford [magnata norte-americano que popularizou a venda dos automóveis], sobre o Model T: “You can have any colour as long as it’s black [pode ter em qualquer cor desde que seja preto]”. E eu percebi que tinha mesmo de concorrer.”

 

 

 

Perguntas de Miss

 

Guilhermina

Qual a qualidade mais importante de um homem?

A inteligência.

É fácil dizer não?

Quando era mais jovem, não sabia dizer não. Demorei, mas agora sei dizer quando devo, sem peso na consciência.

 

Isabela

Descreva-se em duas palavras.

Alegre e descontraída.

Exemplo de um homem sexy.

O meu avô.

 

Geraldina

Uma pessoa que admira.

O meu pai.

O que a deixa furiosa?

Quando acordo com mau-humor até respirar me deixa furiosa!

 

Guiomar

O que faria se ganhasse um milhão de dólares?

Uau, comprava uma casa!

Qual a sua melhor qualidade?

Sou bastante sociável.

 

 

O que pensam das manas?

 

Mina é…

“A mais envergonhada. Sempre foi e ainda é. Mas só em público, entre nós é a que tem a personalidade mais forte. Como é a mais velha, quando éramos crianças tomava conta de nós.”

Bela

 

“A mais certinha. É um bocadinho tímida… mas também não é madre (risos). Por exemplo, se eu vestir um decote um pouco mais pronunciado, chama-me logo a atenção (risos).”

Dina

 

“Mãe-galinha. Está sempre está a tomar conta dos filhos, nunca imaginei que fosse assim. Mas depois de ter filhos ficou mesmo mãe-galinha, sempre atrás dos filhos, toda preocupada (risos).”

Guiomar

 

Bela é…

“Uma pessoa que adora sapatos, malas, ir às compras. Eu não!”

Mina

 

“A menos faladora. Mas quando fala manda bocas que acertam mesmo onde dói (risos).”

Dina

 

“Muito ‘misca’ (gargalhada), está sempre agarrada ao dinheiro. Agora já não é assim tanto, mas quando era mais nova sim. Por exemplo, quando era convidada para uma bebida dizia ‘não tenho dinheiro, não vai dar’ (risos)”

Guiomar

 

Dina é…

“Esquisita (risos)… Gostava de ir pescar sozinha, ir ao cinema sozinha. Faz o que lhe apetece, sem se preocupar com as consequências. E gosta de comprar porcarias… compra, compra, mas para que serve ela não sabe (risos)”

Mina

 

“A mais descontraída. É muito directa, às vezes ofende as pessoas sem saber (risos). E era a que praticava menos desporto, é a mais preguiçosa. O desporto dela é dormir (risos).”

Bela

 

“A mais distraída. Está sempre com a cabeça no ar, esquece isto e aquilo, anda sempre a perder coisas (risos)”

Guiomar

 

Guiomar é…

“Uma pessoa que gosta de ajudar amigos sem pensar em recompensas. É muito generosa.”

Mina

 

“A mais maria-rapaz. Se fôssemos desafiadas a fazer bungee jumping, por exemplo, seria logo a primeira a dizer vamos.”

Bela

 

“A mais bruta (risos). Contou-me que uma vez, quando era miúda, para aí com 15 anos, fez uma viagem de táxi e faltava uma pataca no troco, o que na altura ainda era alguma coisita. Ela teve de pedir, mas o taxista disse que era gorjeta. ‘Gorjeta só se eu der, isso é roubo!’ E o taxista atirou a pataca para ela apanhar. Quando a Guiomar saiu, pegou na moeda e começou a bater com ela na cabeça do taxista, que ainda por cima era careca. ‘Toma a gorjeta, toma a gorjeta!’ (risos).”

Dina