PME | “Sou ribatejano, gosto de pegar touros de frente”

Director criativo num grande casino, Nuno Veloso ultrapassou todos os desafios em três anos. Quando o tédio se instalou, ele disparou o flash – despediu-se para abrir a sua produtora de fotografia e vídeo. À frente da Core Productions, é todos os dias fotógrafo, como sempre foi, mas também o empresário que lidera a gestão. E trabalho não lhe falta.

Nuno Veloso_Core

 

Texto Nuno G. Pereira | Fotos Gonçalo Lobo Pinheiro

 

Há quatro anos, Nuno Veloso recebeu uma proposta aliciante: tomar as rédeas da direcção criativa do grupo Sands China para a área de fotografia. Um desafio que exigia mais do que a sua experiência acumulada. “Tive de montar o departamento de fotografia, gerir pessoal e equipamentos, fazer a ligação entre as unidades de negócio. Não foi fácil para um fotógrafo de moda. Estava habituado a fotografar meninas e meninos todos ‘XPTO’, com uma equipa para tratar dos cabelos, da maquilhagem e da roupa. Agora ia fotografar pratos de comida, fichas de casino, espaços arquitectónicos, além de ser responsável pelo controlo de qualidade. Havia ainda outra dificuldade: lidar com muitas pessoas, incluindo chefias de vários departamentos, em que uns querem uma coisa e outros querem outra.” Apesar dos riscos, foi à luta. “Era um desafio único, trata-se do maior casino do mundo. E eu, freelancer há já 12 anos, ia ter um trabalhinho com um óptimo salário ao fim do mês pela primeira vez, além de um grande enriquecimento do currículo… claro que aceitei. Andei três anos e meio de fato e gravata, agora felizmente já não uso todos os dias (risos). Mas foi bom, aprendi muita coisa. Se tiver uma reunião amanhã com o Obama não vou suar das mãos de certeza.”

Ao fim desses três anos e meio, Nuno tinha dominado a máquina. Era um profissional com capacidades que ultrapassavam a fotografia, a ganhar bem, sem stresse. Encontrava-se confortável. E foi esse o problema. “Já não havia desafio.”

A ideia de ter o próprio negócio tinha amadurecido, decidiu avançar. “Quis juntar aquilo que sabia agora fazer enquanto gestor com a parte criativa e visual, criando uma só coisa: a Core Productions. Quando contei aos meus patrões que ia embora, disse-lhes que possivelmente estava a ter a atitude mais estúpida da minha vida. Mas era inevitável, não consigo estar quieto. Sou ribatejano, gosto de pegar touros de frente. Sentado na bancada a vê-los não é para mim.”

Nuno Veloso_Core

Vida de patrão

A Core Productions, produtora de fotografia e vídeo, arrancou em Abril, e já fechou contrato com grandes empresas locais. “Tem três serviços fundamentais: produção (se alguma equipa quiser vir fotografar ou filmar a Macau, prestamos o serviço de produção), fotografia (tudo: pré-produção, produção, concepção e pós-produção) e vídeo (também tudo). Fazemos ainda consultoria de comunicação visual de marcas.”

A empresa é só de Nuno, colocando-o numa posição inédita. É bom ser o patrão? “A grande vantagem é o poder de decisão, isso faz com que as coisas aconteçam mais depressa. Mas estar sozinho também implica menor capacidade de investimento, o que se reflecte no número de pessoas que posso contratar. A Core Productions começou com três pessoas a full-time, incluindo eu. A dificuldade é fazer o raciocínio entre a quantidade de mão-de-obra que tenho e os objectivos que quero atingir. Se fosse eu e mais cinco seria muito melhor.”

Acrescenta que a sua rede pessoal de contactos proporcionou à empresa um início empolgante, com muitos pedidos de trabalho e a concretização de contratos. Apesar do número reduzido de empregados, conta com colaboradores externos que, garante, foram escolhidos a dedo. “São pessoas com quem temos uma parceria segura, porque conhecemos bem o seu trabalho. Somos pequeninos – chamamo-nos boutique production house – e é assim que queremos ser, privilegiando qualidade sobre quantidade.” O mercado gosta? “O cliente tem de estar consciente disso, o que é difícil na China. Quando ouço ‘ah, mas o outro faz mais barato’, tenho resposta pronta.” Qual? “Não venho aqui concorrer com preços, venho prestar um serviço e o meu custa X. Tenho a certeza que se for a um restaurante com estrelas Michelin não vai estar a discutir o preço do prato.”

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Regresso a Macau

Nascido em Portugal há 36 anos, Nuno veio para Macau em 2009. Pela segunda vez, porque já cá tinha estado. “Vim com dez anos, estive cá até aos 17 e depois voltei para Portugal. Acabei lá a faculdade, trabalhei uns anos e depois fui para Londres, onde fiquei cinco anos.” A vida na capital inglesa era proveitosa do ponto de vista profissional e financeiro, mas ele e a mulher, Marta, queriam outra vida. Menos extenuante, mais familiar. “Londres é uma cidade ultracansativa. Estava a trabalhar 16, 17 horas por dia, porque geria um estúdio de fotografia durante oito horas e depois tinha a minha carreira de fotógrafo de moda para tratar. Esgotante. Além disso, competia com milhares de fotógrafos. Um gajo adoece uma semana, na seguinte já perdeu um cliente. E o clima… Cinco anos sem sol chegou (risos). A minha mulher é arquitecta, trabalhava na 22.ª melhor companhia de arquitectura do mundo, tudo cinco estrelas, mas estávamos cansados e queríamos aumentar a família. Só que ter um filho em Londres nem pensar, não tínhamos capacidade financeira para pô-lo nos colégios dos príncipes e também não queríamos que fosse para a escola pública.” Ponderaram ir para Angola ou Brasil, mas escolheram Macau, onde se tinham conhecido. Depois de uma falsa partida em 2008, vieram mesmo em 2009, quando Marta arranjou emprego no gabinete de arquitectura de Carlos Marreiros. “Tive então a percepção que era impossível sobreviver em Macau só fotografando moda. Mas não desisti, apanhei o barco, ia e vinha todos os dias para Hong Kong, tinha os meus clientes lá, as revistas para as quais trabalhava. Foi assim que me aguentei durante ano e meio, até que recebi a proposta por parte de um casino.”