O museu que cresceu com a RAEM

Duas décadas depois de abrir portas, o Museu de Arte de Macau não se afirma apenas como um lugar de exposição. A educação artística da população está hoje bem presente naquele que é o único museu em Macau dedicado exclusivamente à arte

Texto Catarina Mesquita  | Fotos Gonçalo Lobo Pinheiro 

No próximo mês de Março celebram-se 20 anos da criação do Museu de Arte de Macau (MAM). Na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) – que nascia também no mesmo ano que o museu – surgia um espaço de cerca de 10 mil metros quadrados para expor as obras de grandes nomes da arte local e internacional.

A 19 de Março de 1999, o edifício moderno, localizado na Zona dos Novos Aterros do Porto Exterior, era inaugurado pelo então presidente português Jorge Sampaio. “Apesar do seu valor arquitectónico, o MAM não é só um edifício. É um lugar onde é feito muito trabalho pelos artistas”, sublinhou, em entrevista exclusiva à MACAU, Chan Kai Chon, ex-director do MAM e que no passado mês de Janeiro assumiu o cargo de vice-presidente do Instituto Cultural de Macau. “O museu antecipou a fundação da RAEM e cresceu ao mesmo tempo que ela.”

Uma casa para muitos artistas

O silêncio domina no interior do museu: um absoluto contraste com os sons de uma cidade agitada e em constante movimento e crescimento lá fora. Os passos dos visitantes ecoam por salas amplas e rampas que ligam os diferentes pisos, estrategicamente organizados com exposições específicas.

O piso mais elevado foi reservado para exposições de arte tradicional chinesa. O MAM tem criado relações próximas com museus de arte de várias regiões da China, como o Museu Imperial de Pequim, o Museu de Xangai e de regiões como Nanjing e Zhejiang. É neste espaço que têm sido expostas muitas obras que nunca foram mostradas ao público anteriormente, como é o caso de peças de artilharia e pinturas da corte Qing, as pinturas de Wu Li – também conhecido por Xavier Simões da Cunha –, entre outras de grande valor artístico e histórico.

“Ao longo dos tempos [o museu] tem vindo a tornar-se um posto de divulgação da cultura chinesa. É de sublinhar o intercâmbio com o Museu do Palácio Imperial que tem permitido realizar todos os anos, em Macau, uma exposição com obras do museu de Pequim (…) Mas o MAM não está só focado em expor peças de caligrafia e pintura chinesas, mas de outras formas de arte”, acrescentou Chan Kai Chon.

Na sua história, o MAM traz consigo todo o passado do primeiro museu de arte de Macau, o antigo Museu de Camões, criado em 1910. Quando este encerrou, o espólio foi adquirido pelo MAM e é hoje exposto estrategicamente amiúde.

Daí que hoje o terceiro piso do museu esteja reservado às obras da colecção permanente do MAM, onde já foram dadas a conhecer a colecção de peças de cerâmica de Shiwan – que viriam a inspirar o ceramista português Bordallo Pinheiro –; pinturas a óleo; acrílico e esboços, como por exemplo, os trabalhos de George Chinnery; fotografias históricas, entre outras relíquias únicas.

Já o segundo piso está exclusivamente reservado às exposições temporárias, sendo
um espaço versátil que já recebeu desde pinturas de Marc Chaggall, aos trabalhos do artista russo radicado em Macau Kostantin Bensmertny, a instalações de arte moderna do Centro Pompidou (Paris, França), entre muitos outros.

Em 2008 o rés-do-chão deu lugar à Praça da Arte, um espaço com 700 metros quadrados que reúne um ateliê de litografia, um estúdio, uma sala polivalente e uma sala para projecção de conteúdos audiovisuais. É aqui são feitas muitas actividades lúdico-pedagógicas para crianças de forma a educá-las para a arte, um dos principais objectivos do museu.

Educação artística como prioridade

Em Agosto de 2018, com o apoio do MAM, 16 estudantes universitários de Macau iniciaram um estágio no Museu do Palácio Imperial de Pequim. Esta foi a continuação de um projecto já iniciado entre Pequim, Hong Kong e Cantão do qual agora Macau faz parte e que integra os alunos estagiários em várias unidades do museu, dependendo das suas áreas de estudos e que podem ir desde a tradução à gestão administrativa, da curadoria ao restauro de obras de arte.

Com este programa, o Museu tem como objectivo aumentar o acesso à cultura chinesa, permitir que os alunos de Macau façam um intercâmbio de ideias com as regiões vizinhas, neste caso com os estagiários de Hong Kong e Cantão que também integram o projecto, e trazer novas ideias para Macau.

Ainda com o foco na educação artística, o MAM tem uma parceria com a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) para a organização de visitas ao museu de alunos do sexto ano de escolaridade de todas as escolas da RAEM. O objectivo não é só promover a apreciação da arte no geral, mas a educação cívica onde os alunos aprendem como se comportar dentro de um museu, “algo que podem aplicar quando vão, por exemplo, visitar um museu nas férias”, explicou Chan Kai Chon.

 

Segundo o actual vice-presidente do Instituto Cultural, “o MAM fornece condições para que as crianças se expressem, façam amizades e explorem as cores de que tanto gostam”, havendo assim uma tentativa de que o museu faça parte da vida de crianças e jovens. Chan Kai Chon sublinha ser “optimista, no sentido que a arte ainda se vai tornar algo mais visível na vida de Macau”.

Mostrar Macau e dar a conhecer o mundo

O MAM tem dado a conhecer localmente o que se fez e faz a nível internacional, mas também tem levado os trabalhos dos artistas de Macau a outros pontos, nomeadamente à Bienal de Veneza.

Aquando da sua abertura, o MAM passou a ser a porta de entrada dos artistas para o Interior do País. A missão de plataforma cultural surgia há 20 anos quando a cultura ocidental e oriental se encontravam por intermédio do MAM.

Actualmente, a par com o Instituto Cultural de Macau, o Museu é responsável pelo pavilhão  Macau-China na Bienal de Veneza, que já serviu de montra para grandes nomes da arte local, como Mio Pang Fei. Este ano irá dar a conhecer os trabalhos dos artistas Lio Sio Man e Heide Lau no certame de grande destaque internacional que se inicia em Maio.

 

Duas décadas passadas da abertura das portas do museu é altura de balanços e o crescimento é visível: tanto o número de artistas como o de exposições tem aumentado, tendo mesmo o museu que rejeitar alguns pedidos de exibição por não ter mais espaço no calendário.

As parcerias com os Serviços de Turismo de Macau têm também permitido que mais visitantes entrem no Museu, o que se torna um desafio para a instituição, no sentido de ir ao encontro dos gostos e das expectativas de quem o visita. Chan Kai Chon diz que tinha um sonho “ambicioso” de tornar o MAM “um lugar para todos”, tendo em conta o sem-número de gostos para um espaço limitado. Daqui a 20 anos terá esse objectivo sido cumprido?

Segundo o actual vice-presidente do Instituto Cultural de Macau não serão precisas mais duas décadas para se assistir a grandes mudanças. “Acredito que daqui a 10 anos a arte vai ter uma importância maior, uma vez que as universidades têm cada vez mais cursos e há mais pessoas a trabalhar nesta área.”