China-Brasil | Novos horizontes entre velhos parceiros

(Brasília - DF, 13/11/2019) Declaração à Imprensa. Foto: Alan Santos/PR
O Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, visitou a República Popular da China em Outubro para um encontro com o homólogo chinês Xi Jiping. Durante a visita da comitiva brasileira foram assinados oito protocolos nas áreas de infra-estruturas, agropecuária, energia e educação, num sinal de afirmação da parceria estratégica entre os dois países

Texto Sandra Lobo Pimentel

Praticamente um ano após a eleição que deu a vitória a Jair Bolsonaro nas presidenciais brasileiras, o Chefe de Estado deslocou-se a Pequim onde se reuniu com o Presidente Xi Jinping. Bolsonaro foi recebido com honras de Estado no Grande Palácio do Povo, na capital chinesa, e ainda antes do encontro, falou num “futuro brilhante” para as relações sino-brasileiras, afirmando ainda o “longo alcance” dos interesses estratégicos entre os dois países.

O Presidente brasileiro não escondeu a importância da República Popular da China no capítulo comercial. “Estava ansioso por esta visita porque temos na China o nosso primeiro parceiro comercial, e interessa-nos muito fortalecer esse comércio”, afirmou Bolsonaro, acrescentando: “Podemos dizer que o Brasil precisa da China e a China também precisa do Brasil”.

Na pasta da economia, Jair Bolsonaro admitiu que o Brasil e a China conservam algumas diferenças, que se traduzem, por exemplo, na ausência do país sul-americano na iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, mas a visita permitiu aproximar os dois países, que fazem parte dos BRICS, grupo que inclui ainda a Rússia, a Índia e a África do Sul.

A China é o primeiro destino dos produtos brasileiros, representando quase o dobro do segundo destino, os Estados Unidos, e desde há dez anos que é o maior parceiro comercial do Brasil. Em 2018, as exportações para a China representaram 26,8 por cento do total das vendas do Brasil ao exterior e atingiram um pico de 64,2 mil milhões de dólares norte-americanos. O país asiático também é um dos principais fornecedores de investimento em áreas cruciais, como infra-estruturas e energia.

Os dois países passaram a reconhecer as certificações de Operador Económico Autorizado emitidas pelas autoridades aduaneiras de ambos os lados. Uma empresa com esta certificação usufrui de alguns benefícios, como tratamento prioritário, menos inspecções, requisitos menos rígidos de segurança e expedição agilizada.

Um memorando de entendimento assinado nesta visita também prevê contactos institucionais mais regulares e directos entre os ministérios das Relações Exteriores do Brasil e dos Negócios Estrangeiros da China a fim de facilitar a comunicação e o tratamento de questões de maior relevância entre os dois países.

Energia com papel importante

Outra das vertentes importantes da visita de Jair Bolsonaro a Pequim, que aliás, encabeçou uma comitiva que integrou outros membros do seu Executivo, teve em vista o leilão de petróleo, que decorreu no início de Novembro, com o Presidente brasileiro a aproveitar para convidar as empresas estatais chinesas para participarem na oferta de áreas de exploração no pré-sal, uma área de reservas petrolíferas que fica debaixo de uma profunda camada de sal, formando uma das várias camadas rochosas do subsolo marinho. Compreende uma faixa que se estende ao longo de 800 quilómetros, englobando os Estados do Espírito Santo e de Santa Catarina, abaixo do leito do mar, além das bacias sedimentares do Espírito Santo, Campos e Santos.

Na área de energia, Brasil e China estabeleceram a cooperação para o desenvolvimento de energias novas e renováveis, bioenergia e para distribuição e eficiência energética. O acordo prevê ainda a cooperação e a coordenação com terceiros países e fóruns internacionais.

Foi ainda entregue à State Grid Corporation o termo de licença de operação, que marca a conclusão das obras do projecto de transmissão de energia elétrica entre o complexo de Belo Monte, no Pará, e o Rio de Janeiro, com uma extensão de 2500 quilómetros.

Um acordo firmado entre o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e a CTG Brasil, subsidiária da China Three Gorges Cooperation, também permitirá a criação de um centro de pesquisa e desenvolvimento projectado, especialmente, para a investigação na área de energia limpa.

Elogio à carne brasileira

Um dos produtos que o Brasil tem como grande cartaz da sua produção é a carne. Tanto o Presidente como a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, tentam abrir mercados como parte da política de diplomacia económica.

O esforço do Brasil para publicitar a qualidade da carne produzida no país engloba também algumas políticas domésticas, com a ministra da pasta a exortar os produtores brasileiros a adquirirem novos frigoríficos que contenham as necessárias especificações para exportar para o gigante asiático. Depois da reunião entre Bolsonaro e Xi Jinping, Tereza Cristina participou na assinatura de protocolos sanitários com a China, que voltou a permitir a importação de farelo de algodão e carne bovina termo-processada.

Em 2018, o Brasil exportou 557 milhões de dólares norte-americanos em carne bovina processada e a China importou 25 milhões deste produto. Já no caso do farelo de algodão, usado como ração animal, a exportação brasileira ainda é incipiente. Mas a expectativa é que as negociações possam continuar a breve trecho.

Tereza Cristina confessou optimismo após a visita e advogou que será criado um núcleo dirigido exclusivamente para a China no Ministério da Agricultura, que contemplará os meios necessários ao estreitamento das relações, nomeadamente, pessoal técnico que domine o mandarim e ainda a relevante legislação chinesa, de forma a facilitar a comunicação e garantir a eficiência.

Gestos de aproximação

Jair Bolsonaro foi enfático nas palavras durante o encontro com Xi Jinping, classificando a China como “um mar de oportunidades” para o Brasil. O presidente brasileiro falava, essencialmente, na necessidade de equilibrar as contas públicas e ser um parceiro de confiança para as potências mundiais.

Umas das decisões mais significativas das que saíram da deslocação à China prende-se com a flexibilização da política de vistos. Os cidadãos portadores de passaporte da República Popular da China passam a estar isentos de visto de entrada no Brasil. Jair Bolsonaro considera um gesto de aproximação que sinaliza o empenho do Palácio do Planalto em estreitar as relações diplomáticas e económicas com o parceiro asiático. A isenção serve não só para as viagens cujo propósito seja o turismo, mas também quando o objectivo sejam os negócios.

Outros dos destaques foi o acordo de cooperação académica assinado entre a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), entidade que surge como principal financiadora de investigação académica do Brasil, e a Fundação Nacional de Ciências Naturais da China, a agência chinesa de promoção de investigação e inovação.

De acordo com a Capes, esta é a primeira parceria académica do género entre Brasil e China e deve beneficiar o recentemente lançado programa brasileiro “Future-se”, que tem em vista, também, a internacionalização das universidades brasileiras.

O acordo prevê o intercâmbio académico, educativo e científico entre professores, investigadores e pós-doutorandos de instituições brasileiras e chinesas, além do apoio a seminários, oficinas e conferências. Ambos os governos financiarão jovens cientistas e investigadores que concluíram o doutoramento num período de cinco anos antes da apresentação de propostas. O país remetente cobrirá os custos de viagens internacionais, seguros e bolsas de estudos, enquanto o receptor garantirá condições para as actividades de investigação e acesso a material bibliográfico durante o período de intercâmbio dos jovens. Os detalhes do acordo serão mais tarde divulgados, mas já se sabe dará primazia às áreas de ciências da vida, biodiversidade e engenharia.

Também foi assinado um acordo entre a Universidade Federal de Goiás e a Universidade de Hebei para o estabelecimento de Instituto Confúcio na instituição brasileira. O instituto prevê proporcionar aulas de mandarim, de cultura chinesa e medicina tradicional. Actualmente, estão em funcionamento no Brasil dez unidades do Instituto Confúcio.

Destaque também em Macau

Em paralelo com a visita presidencial o potencial turístico do Brasil foi um dos destaques da oitava edição do Fórum de Economia de Turismo Global, realizado na RAEM, entre os dias 13 e 15 de Outubro. Com o tema “Turismo e Lazer: Para uma vida melhor”, o evento reuniu os principais líderes mundiais, além de investidores e especialistas do sector. Nesta edição o Brasil assumiu a tarefa de país convidado de honra, a par da Argentina, lugar que foi ocupado no ano passado pela União Europeia.  

O Brasil considera a China como parceiro estratégico também nas áreas de turismo e lazer, e foi representado no evento pelo ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, que chefiou a delegação brasileira.

A organização do Fórum sublinhou o potencial do Brasil, que, considera, vai muito além da economia e das belezas naturais, passando pela saborosa culinária regional, sons, culturas, entre outras características marcantes.

O programa do evento, como sempre, foi composto por sessões de debate, entrevistas especiais, bolsas de contacto, apresentações turísticas e exposições, entre outras actividades.

Entre os convidados de honra que presidiram à cerimónia de encerramento, estiveram o vice-presidente do Comité Nacional da Conferência Política Consultiva do Povo Chinês e presidente do Fórum, Edmund Ho, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura e presidente executivo do Fórum, Alexis Tam, e ainda a vice-presidente e secretária-geral do Fórum, Pansy Ho.

A partir do conceito de “uma vida melhor”, preconizado pelo Presidente Xi Jinping, a edição de 2019 debateu assuntos ao nível da economia de turismo global, analisando formas para a diversificação da oferta turística, conseguir atender às exigências em constante expansão dos visitantes internacionais e elevar a qualidade de vida e o bem-estar.

No discurso no encerramento desta edição, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, referiu que “enquanto agentes de turismo, devemos todos aspirar a uma indústria próspera que crie os melhores locais para os viajantes visitarem, sem que tal seja descontado na qualidade de vida dos residentes”.

Alexis Tam assinalou que 2019 “é um ano especial para Macau”, pela celebração dos 70 anos da fundação da República Popular da China mas também pelos 20 anos do estabelecimento da RAEM. “Esta é a altura de excelência para avançarmos no nosso desenvolvimento como um centro mundial de turismo e lazer, com o colorido pano de fundo da iniciativa ‘Uma Faixa, Uma Rota’ e das acções de colaboração com as nossas cidades irmãs da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau.”

Já Pansy Ho lembrou que o Fórum “foi fundado com a missão de ligar o Oriente e o Ocidente ao nível dos interesses em turismo” e que, mediante essa colaboração, é possível “criar algo concreto, consolidando o potencial de Macau para se tornar numa capital de encontro de turismo promotora do crescimento do turismo regional”.

A vice-presidente do Fórum manifestou esperança de que o evento “tenha mostrado como Macau é mais uma prova viva do poder transformador do turismo. Em Macau temos continuado não só a reinvestir como a reinventar. Abençoados pela nossa política nacional, Macau está pronta para embarcar numa nova vaga de desenvolvimento, à medida que continuamos a integrar o quadro da Grande Baía, contribuindo com a nossa experiência em turismo para impulsionar a colaboração inter-sectorial com os nossos vizinhos, partilhar a nossa cultura e património com o mundo, e imbuir as nossas gentes de um sentido de orgulho nacional”, referiu.

Ainda na edição deste ano, foi divulgado o mais recente “Relatório Sobre as Tendências do Turismo na Ásia”, em parceria com a Organização Mundial do Turismo e com o Centro de Pesquisa de Economia de Turismo Global. O relatório permitiu aos participantes conhecerem as últimas tendências de desenvolvimento do turismo na Ásia-Pacífico, saber como agarrar as vastas oportunidades de desenvolvimento do turismo na Argentina e no Brasil, bem como conhecer o potencial do desporto e bem-estar enquanto novas áreas de desenvolvimento do turismo no continente asiático.

Perto de dois mil dignitários ministeriais, líderes da indústria, a par de especialistas e académicos, entre outros convidados de países e cidades de todo mundo, marcaram presença no certame.

(Brasília – DF, 13/11/2019) Declaração à Imprensa. Foto: Alan Santos/PR

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2018: Ano de recordes

Balança comercial Brasil-China (em US$ mil milhões)

Exportações brasileiras          64,2 (+36%)

Importações brasileiras         34,7 (+30%)

Saldo                          29,4 (+35%)

Saldo comercial 2006-2018

2006    0,4

2007    -1,9

2008    -3,5

2009    5,1

2010    5,2

2011    11,5

2012    7,0

2013    8,7

2014    3,3

2015    4,9

2016    11,8

2017    20,2

2018    29,5

Principais produtos exportados pelo Brasil para a China

Em US$ milhões

Produto                      Valor               Peso

Soja                             27.343            43%

Petróleo bruto        14.334             22%

Minérios de ferro    10.929            17%

Celulose                      3216               6%

Carne bovina              1487               2,3%

Ferro-ligas                  913                 1,4%

Carne de frango         800                 1,2%

Algodão                      491                 0,8%

Carne de porco          304                 0,5%

Outros                        4067               6%

Principais produtos importados da China

Em US$ milhões

Produto                                             Valor               Peso

Materiais eléctricos e partes             9499                27%

Instrumentos mecânicos e partes     4681                14%

Embarcações e estruturas flutuantes           3689               11%

Produtos químicos e orgânicos         2855                8%

Veículos automóveis e partes                       1045               3%

Plásticos                                             992                  3%

Instrumentos de óptica                     841                  2,4%

Ferro fundido e aço                           781                  2,2%

Filamentos sintéticos ou artificiais    680                  2%

Obras de ferro fundido ou aço          638                  1,8%

Outros                                                9029                26%

Fonte: Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços do Brasil